Que imagem você tem do sertão do nordeste brasileiro? Solo árido, sol, caatinga,
jegues? Agora, olhe para a foto ao lado . A imensidão de terras, antes
pincelada de cinza, hoje tem o verde das plantações como cor predominante. É o
Vale do São Francisco, uma área de terras banhada pelo grandioso Rio São
Francisco e situada entre os Estados da Bahia e Pernambuco. Milagre? Não. É a
tecnologia da agricultura irrigada. Nessas terras férteis as frutas são
destaque. Há uma mistura de cores, aromas e sabores. Acerola, caju, manga,
melancia e uva. Sim, a videira, planta que reina absoluta na Serra Gaúcha e que
é a base para o sustento de muitas famílias também frutifica neste oásis
nordestino.
Nessas terras
são plantadas variedades para consumo in natura e também para
elaboração de vinhos finos, que inclusive têm recebido prêmios nacionais e
internacionais nos últimos anos. Um dos últimos prêmios foi para um tinto da
variedade Syrah elaborado pela Vinícola Ouro Verde, empresa do grupo Miolo. O
Testardi conquistou o 1º lugar na categoria Tinto Nacional na degustação Top Ten
promovida durante o Expovinis 2012, maior salão do vinho realizado na América
Latina. E foi justamente depois de mais esta conquista para os vinhos do
nordeste que conhecemos melhor o Vale do São Francisco, região vitivinícola
brasileira que ganha cada vez mais destaque. Além de visitarmos vinícolas e
degustarmos uvas e vinhos, conhecemos projetos relacionados ao desenvolvimento
do setor pela perspectiva política de incentivos nas áreas política, turística e
de pesquisa.
Terroir diferenciado
Cada garrafa de vinho traz uma
história, e nenhuma é igual à outra. O Brasil possui nove regiões vitícolas.
Cada uma delas elabora produtos com tipicidades distintas, já que os fatores
naturais e humanos se diferem. É o chamado terroir. O Vale do São Francisco se
caracteriza por apresentar vinhos tropicais, produtos leves, sem pretensões de
guarda, fáceis de beber e com boa relação qualidade/preço. Esta região está
integrada pelos municípios de Casa Nova, na Bahia; e Petrolina, Lagoa Grande e
Santa Maria da Boa Vista, em Pernambuco. Por lá, a produção de vinhos iniciou na
década de 1980, por meio da vinícola Botticelli, e foi reforçada no início dos
anos 2000 com a chegada de grandes investidores, entre eles os grupos Miolo, da
Serra Gaúcha, e Dão Sul, de Portugal.
Atualmente, existem seis vinícolas, uma na Bahia e cinco em Pernambuco, que produzem cerca de 7 milhões de litros de vinhos finos por ano, em 700 hectares de vinhedos. A atividade emprega em média 6 mil pessoas, direta e indiretamente, chegando a 30 mil se for incluída a produção de uvas de mesa. A região está situada entre os paralelos 8 e 9 do Hemisfério Sul, em clima tropical semiárido. Está a 350m de altitude, com média anual de temperatura de 26ºC, índice de pluviosidade média de 550mm concentrada entre os meses de janeiro a abril.
Um dos fatores que mais chama a atenção no Vale do São Francisco é a capacidade de a colheita acontecer durante o ano todo, caso único no mundo. Numa mesma vinícola é possível observar todos os ciclos do vinhedo, desde o plantio até o momento em que as uvas são colhidas. “Por se tratar de uma região de clima quente, com alta luminosidade e água em abundância para a irrigação, as empresas fazem um planejamento da época em que pretendem colher. Depois, realizam a poda de produção em diferentes períodos, adotando, com isso, o sistema de escalonamento para a poda dos lotes, o que proporciona períodos diferentes de colheita. Entre uma safra e outra, reduzem a irrigação para 15% a 20%, nos períodos secos, por cerca de 20 a 30 dias (este corresponde ao período de inverno em regiões temperadas). Em seguida, podam, aplicam cianamida hidrogenada para homogeneizar a brotação, aumentam a irrigação para 100% do coeficiente de cultura e um novo ciclo é iniciado”, explica o pesquisador das áreas de viticultura e enologia da Embrapa Semi Árido, Giuliano Elias Pereira.
O pesquisador também destaca outra característica importante das empresas: a possibilidade de escalonamento da produção. Com isso, não são necessárias grandes estruturas para vinificação em função da não concentração da produção em um período curto. As variedades mais utilizadas para a elaboração de vinhos tintos finos são Syrah, Tempranillo e Cabernet Sauvignon. A estas cepas se soma m as variedades Alicante, Aragonês, Tannat e Rubi Cabernet.
Mas há outra que tem se destacado nas pesquisas da Embrapa Semi Árido: é a Petit Verdot. “Acredito no potencial desta uva. Ela pode ser a uva emblemática desta região, já que Syrah podemos encontrar em várias partes do mundo”, diz o pesquisador. Para vinhos brancos, Chenin Blanc e Moscato Cannelli se destacam, além da Sauvignon Blanc, Verdejo e Viognier. Para os espumantes, ganham espaço as variedades Itália, Chenin Blanc e Syrah. “Os vinhos apresentam características interessantes. Os brancos são leves, com aromas florais, fáceis de serem consumidos. Os tintos são variados, desde vinhos leves, jovens, até vinhos mais encorpados, que passam por algum período em barricas”, pontua Pereira. Os espumantes naturais são, na maioria, secos ou demi-sec, além do moscatel. O sistema de condução mais utilizado é a latada, seguido pelo espaldeira.
Turismo: Vapor do Vinho
Conhecer o
Vale do São Francisco é um privilégio. Mais ainda é poder navegar pelas águas do
Rio São Francisco e vislumbrar toda a beleza deste que por onde passa só leva
riqueza. Desde abril de 2011 os turistas que vão ao Vale têm a oportunidade de
participar de um passeio denominado Vapor do Vinho. O roteiro começa com o
traslado rodoviário das orlas de Juazeiro e Petrolina. Depois de alguns minutos,
os turistas chegam ao Porto Chico Periquito, no município de
Sobradinho.
De lá, embarcam e navegam em direção ao Lago de Sobradinho, o segundo maior lago artificial do mundo (o primeiro é o Lago Volta, em Gana). Antes, conhecem a Barragem de Sobradinho e realizam a eclusa (processo que permite que a embarcação transponha um desnível de água de mais de 30 metros). Durante o passeio, de cerca de duas horas, os visitantes podem curtir a paisagem e degustar vinhos, espumantes e a gastronomia típica, além de ouvir música regional e poesias recitadas pelos tripulantes.
O passeio finaliza com a visita às fazendas Fortaleza e Ouro Verde. Na primeira, os turistas conhecem a produção de mangas e degustam a fruta. Na segunda, além de apreciarem a beleza dos vinhedos, conhecem a vinícola, o processo de elaboração do vinho e do brandy (destilado de vinho) e participam de um curso de degustação.
O Vapor do Vinho recebeu este nome em alusão aos antigos vapores que contribuíram para o desenvolvimento do Nordeste e, em especial, o Vale do São Francisco. É uma parceria entre as empresas Fazenda Fortaleza (Fruticultura de Uva e Manga), Vinícola Terranova (Miolo Wine Group) e Vapor do Vinho (Barca Rio dos Currais).
Diz a lenda que o Negro d’Água habita diversos
rios. No São Francisco, há um monumento do escultor juazeirense Ledo Ivo Gomes
de Oliveira, obra com mais de 12 metros de altura construída dentro do leito do
rio, na cidade de Juazeiro (BA). Segundo a lenda, manifestando-se com suas
gargalhadas, preto, careca e com mãos e pés de pato, o Negro d’Água derruba a
canoa dos pescadores se eles se recusarem a dar-lhe um peixe. Em alguns locais
do Brasil ainda existem pescadores que, ao saírem para pescar, levam uma garrafa
de cachaça e a atiram para dentro do rio, para que não tenham sua embarcação
virada.
A Usina Hidrelétrica de Sobradinho é um
aproveitamento hidrelétrico localizado no rio São Francisco, no município de
Sobradinho. Em 1974 a construção da represa e o alagamento da área hoje ocupada
pelo lago artificial levaram ao desaparecimento de cinco municípios baianos:
Casa Nova, Pilão Arcado, Remanso e Sento Sé e o antigo distrito de Sobradinho,
então pertencente ao município de Juazeiro.
Por Andréia Debon
Por Andréia Debon
Fotos: Fabiana Lavarotti
Fonte: O Florense
Nenhum comentário:
Postar um comentário