Vários fatores interferem no preço de um vinho. Aquilo que faz o preço subir, algumas vezes, eleva também a qualidade. Mas nem sempre na mesma proporção. E há fatores que influenciam no preço sem qualquer efeito sobre a qualidade, como marketing, por exemplo. A seguir uma relação de motivos para um vinho ser mais caro que o outro e a explicação de como isso pode ou não interferir na qualidade:
1. O preço da terra onde as uvas são plantadas
O primeiro fator que encarece um vinho é o preço da terra onde as uvas usadas para produzí-lo são plantadas. Um hectare plantado custa mais de 2 milhões de euros em Paulliac, um pedacinho muito especial de Bordeaux onde está o Château Latour e outros grandes châteaux, como o Pichon Longeville. Um vinho que sai dali não deve custar a mesma coisa de um que vem de um vinhedo cujo hectare custa 40 mil dólares no Chile. Isso aumenta a qualidade do produto? Em termos. As terras em Paulliac não são caras à toa. O terroir local, de fato, produz obras-primas. Mas há terroirs ótimos que não são tão famosos e, portanto, não tão valorizados. Em Bordeaux mesmo, na outra margem do Gironde, em Saint-Émilion, a terra é mais barata e os vinhos têm um custo melhor, apesar de também serem fantásticos. Essa super valorização da propriedade complica ainda mais quando a classificação dos vinhos é diretamente ligada à sua terra de origem, como é o caso da Borgonha onde um vinho recebe a classificação máxima, no caso grand cru, porque ele veio de um pedaço de terra classificada como grand cru. Na Côte d'Or, a área considerada mais nobre da Borgonha, um hectare pode custar 9,5 milhões de euros. Um vinho saído dessa terra, com certeza, será caríssimo. Mas não obrigatoriamente será melhor do que o vinho de um ótimo produtor em Mercurey, por exemplo, onde a terra é mais barata. Em resumo, fora casos especiais, evite comprar vinhos de denominações muito famosas. Aceite sugestões de seu vendedor para conhecer regiões menos exploradas.
2. O rendimento por hectare
Quanto menos frutos as videiras derem, mais bem nutridos serão esses frutos. Noventa e nove por cento da qualidade de um vinho depende da qualidade da uva. Para obter uvas com maior concentração de aromas, taninos, corantes, os produtores interessados em qualidade, e não quantidade, trabalham a vinha para que ela dê poucos frutos. Quando os cachos brotam, eles cortam fora vários deles e deixam poucos para que cresçam saudáveis. Com isso, conseguem um vinho melhor. Mas produzem menos. Um vinho feito a partir de um vinhedo que rende 5 toneladas de uva por hectare provavelmente será mais caro do que um que vem de um vinhedo que rende 20 toneladas. Quando a vinha é velha, como na foto, naturalmente ela rende menos frutos. Por isso, vinhos de vinhas velhas costumam ser tão bem cotados. Isso aumenta a qualidade do produto? Sim. Salvo raras exceções em que o produtor escolhe por fazer um vinho menos concentrado por uma razão de estilo, quanto mais baixo o rendimento por hectare melhor o vinho.
3. O preço da mão-de-obra
A vinícola da foto é o Château Changyu, que fica na China, perto de Pequim. Uma réplica quase perfeita de um castelo de Bordeaux. Nem por isso, os trabalhadores que aparecem na foto ganham tanto quanto os trabalhadores franceses. Todo mundo sabe que há países em que a mão-de-obra custa muito mais do que em outros. Isso influencia no preço do vinho, é lógico. Isso aumenta a qualidade do produto? Não. Em Portugal, por exemplo, a mão-de-obra ainda é mais barata do que em outros países europeus, como França ou Alemanha. E os vinhos feitos por lá são maravilhosos. A mão-de-obra na Argentina é mais barata do que na Austrália e os vinhos dos dois países têm níveis parecidos. Portanto, vinhos vindos de países com custo de vida mais baixo costumam ter uma relação preço-qualidade melhor.
4. Colheita manual
Independentemente do custo local da mão-de-obra, o trabalho humano costuma custar mais caro do que o das máquinas. Talvez não na China, mas por aqui nem chega vinho chinês. Mesmo no Brasil, no Uruguai, na Argentina, na Grécia, onde a mão-de-obra é barata, colheita manual é um luxo. Um vinho feito a partir de uvas colhidas à mão costuma ser mais caro do que aquele cujas uvas foram colhidas por tratores. Isso aumenta a qualidade do produto? Sim. A colheita é o momento em que se faz a primeira seleção das uvas. Num mesmo pé de videira, às vezes, há um cacho maduro e outro verde. O homem colhe só o maduro. A máquina, na maioria das vezes, colhe também o verde. A tecnologia moderna aperfeiçoou o trabalho das máquinas. Mas ele ainda não se equipara ao humano. E o grau de amadurecimento da uva é vital importância para a qualidade do vinho.
5. Os custos de vinificação
Não só a mão-de-obra agrícola custa caro, o trabalho artesanal dentro da vinícola também . Portanto, os vinhos artesanais costumam ter o preço mais alto. Equipamentos, como câmaras climatizadas, tanques de fermentação com temperatura controlada, prensas pneumáticas, e matérias-primas, como certas leveduras selecionadas, também podem elevar o custo de produção. Tudo isso reflete no preço final do vinho. Isso aumenta a qualidade do produto? Sim, mas nem tente avaliar porque são muitos detalhes e você ficaria perdido. Apenas repare se no contra-rótulo há algo sobre seleção manual de bagos, produção artesanal ou temperatura controlada. Tudo isso é bom sinal.
6. A qualidade do barril onde ele descansa
Um detalhe da vinificação, no entanto, faz toda a diferença e costuma ser fácil de verificar: a passagem do vinho pela madeira. O carvalho é usado tanto para construir tonéis de fermentação quanto para fazer os barris onde o vinho irá amadureder. Só o fato de um vinho ser fermentado ou descansar em carvalho já faz com que ele tenha um custo maior do que aquele que só passa por inox ou cimento. Para construir tonéis e barricas, são usados carvalhos de três procedências distintas: francês, americano e do leste europeu. O primeiro é bem mais caro do que os dois últimos. Outra coisa que faz diferença no custo é o fato de a barrica ser nova ou usada. Uma barrica nova de 225 litros de carvalho francês custa cerca de 800 euros enquanto uma de carvalho americano custa 300 euros. Isso aumenta a qualidade do produto? Não obrigatoriamente, mas com certeza muda o seu caráter. Se um vinho será fermentado em madeira ou não, se ele passará por carvalho francês ou americano, se as barricas serão de primeiro, segundo ou terceiro uso, tudo isso são decisões que o enólogo tem de tomar pensando em primeiro lugar no que é mais apropriado para a matéria-prima que ele tem em mãos. Mas, sim, carvalho francês de primeiro uso boa parte das vezes é sinal de um vinho mais refinado, até porque o enólogo decidiu investir nele.
7. A qualidade da garrafa, do rótulo, da rolha e da cápsula
O que envolve o vinho também conta na hora de estabelecer um preço. Garrafas mais pesadas costumam ser mais caras, assim como cápsulas de chumbo custam mais do que as de plástico. Rolha de cortiça, recortada da casca da árvore, vale muito mais do que uma rolha de compensado ou de plástico. Já o screw cap (tampa de rosca) e a tampa de vidro não são baratos também. Todos esses insumos podem encarecer um vinho. Isso aumenta a qualidade do produto? Não, mas o uso de uma garrafa cara, uma cápsula boa, uma rolha de verdade costuma ser um indício de que o que tem dentro vale o investimento. Só cuidado com garrafas e embalagens especiais, comemorativas, rótulos gravados a ouro, que em geral acrescentam muito ao preço e nada ao produto.
8. A pontuação que ele recebe
Quando um vinho recebe mais de 90 pontos do crítico americano Robert Parker, seu preço pode não subir imediatamente, mas acaba subindo num prazo relativamente curto. Ter boa pontuação, seja do Robert Parker, da revista Wine Spectator, da crítica inglesa Jancis Robinson ou de outros críticos famosos, agrega valor à marca. Não há como negar. Isso aumenta a qualidade do produto? Não, mas os críticos não são idiotas, uma boa nota é sinal de que o vinho deve ser bom. Mas pode não ser do seu estilo seu preferido. Robert Parker, por exemplo, costuma gostar de vinhos potentes. Já Jancis Robinson, em geral, prefere os elegantes.
9. O mercado e o marketing
Todo mundo já ouviu falar numa coisa chamada "Lei da oferta e da procura", um princípio da economia que estabelece a relação entre a demanda por um produto e o seu preço. Quanto maior a demanda, e menor a oferta, maior o preço. No mercado de vinhos é difícil aumentar a oferta de um produto. Não há como aumentar a produção de um Romanée-Conti, por exemplo. Só pode levar esse nome o vinho feito a partir das uvas do vinhedo Romanée-Conti, que tem 1,8 hectares e ponto. Então, se você quer tomar um Romanée Conti, o Bill Gates e a rainha da Inglaterra também querem. Quem você acha que vai estabelecer o preço de mercado? Isso aumenta a qualidade do produto? Não, definitivamente. A demanda por um produto pode ser gerada por várias razões que vão além da sua qualidade. O Château Petrus, por exemplo, cujas safras mais baratas não custam menos de R$ 12 mil, deve ser de fato um ótimo vinho (nunca tomei), mas é tão mais famoso do que os outros cru classé de Bordeaux simplesmente por uma questão de marketing bem-sucedido. Na coroação da rainha Elisabeth, em 1953, os proprietários do château enviaram uma caixa de Petrus de presente e o vinho foi servido na festa. Mais tarde, eles enviaram uma outra caixa para o presidente americano John Kennedy, que adorou o vinho e saiu falando que era o seu vinho. Boom! A demanda explodiu.
10. Os malditos impostos
A gente sabe que muito do que se paga por um vinho no Brasil se deve aos impostos. Mas você tem ideia de quanto? A carga tributária sobre um vinho nacional é de cerca de 65% do preço. E no europeu, chega a quase 85% do preço. Isso faz o vinho caro. Os importados este ano vão ficar ainda mais caros, pois a alíquota do PIS/Cofins sobre importações, um dos vários impostos que incidem sobre eles, subiu de 9,25% para 11,75%. É bom lembrar também que dentro da zona de interesse do Mercosul não há imposto de importação. Só esse imposto é responsável por cerca de 20% da carga incidente. Isso aumenta a qualidade do produto? Não, obviamente.
Por Tânia Nogueira
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