O grão da uva vira suco, o suco vira vinho, o vinho vira vinagre. A natureza é
mesmo assim. Desde a ação das leveduras que transformam o açúcar de cada grão de
uva em álcool e gás carbônico, até a ação do oxigênio - que num período
prolongado termina por transformá-lo (através da ação de uma bactéria) em ácido
acético (vinagre) -, tudo é um processo absolutamente
natural.
Mas
existem algumas maneiras de preservar o vinho por mais tempo e elas começam já
na vinícola, com rolhas de boa qualidade - nesse ponto as rolhas sintéticas
levam vantagem sobre as de cortiça, pois eliminam quase totalmente o
risco de contaminação - e a utilização do gás SO2, que é um conservante natural
adicionado aos vinhos há centenas de anos.
GARRAFA ABERTA
Para
nós consumidores, no entanto, o que interessa é como conservar aquela garrafa
que foi aberta e não inteiramente bebida, para que o processo natural de
oxidação não estrague o vinho entre um consumo e outro.
Antes
de mais nada, é possível dizer que uma parte dos vinhos de consumo mais
fácil (vinhos mais jovens, com menos madeira, em geral varietais do Novo
Mundo)
podem suportar até um dia na porta da geladeira com a mesma rolha que
foi tirada dele, sem praticamente nenhum problema, uma vez que a baixa
temperatura
desacelera o processo de oxidação e impede que a bactéria acética se
desenvolva.
Já
os vinhos que têm mais estrutura, mais corpo, amadurecimento em madeira
e
muitas vezes mais idade, esses sim necessitam de cuidados. O mesmo se pode
dizer
dos brancos e espumantes, ainda mais delicados.
Para
conservar melhor todos os vinhos (mesmo os jovens) e não correr riscos
desnecessários, é essencial ter um equipamento que é hoje, felizmente, muito
fácil de encontrar. Conhecido como "salva-vinho" ou "vacuvin", é composto por um
jogo de rolhas de borracha e uma bomba que, quando encaixada na rolha, opera por
sucção retirando o ar que ocupou o espaço vazio na
garrafa.
Dessa
forma o, processo de oxidação é mais lento - não é possível pará-lo
completamente - e o vinho poderá ficar na porta de sua geladeira por alguns dias
(dois
dias ao menos para os brancos e até quatro dias para a maioria dos
tintos).
Os
espumantes, no entanto, precisam de um processo diferente, pois o gás carbônico
formado durante a segunda fermentação precisa ser preservado na garrafa,
para que o líquido mantenha sua vivacidade. Assim, a bomba de sucção não é
usada, mas sim uma rolha de metal com proteção de silicone, capaz de manter e
suportar a pressão desse vinho. Com o uso correto dessa rolha, o espumante pode
permanecer na geladeira por mais dois dias, pelo menos - embora para os bons
bebedores seja quase impossível pensar que um espumante possa ser aberto e não
bebido totalmente.
UMA OUTRA DEGUSTAÇÃO
A
garrafa aberta e corretamente conservada não deve desanimar ninguém. Deve - bem
ao contrário - ser transformada em um exercício de percepção, pois a ação do
oxigênio nos vinhos nem sempre leva o produto ao seu declínio final. Por vezes
(o degustador aprende a apreciar isso), um vinho que em uma primeira prova não
estava tão agradável, no dia seguinte pode ter se transformado em um produto bem
mais interessante, seja pela oxigenação, seja pela mudança natural de nosso
paladar. Óbvio que o contrário também pode ocorrer, principalmente com os vinhos
mais
velhos, cuja estrutura química já se encontra mais fragilizada e o oxigênio só
vai apressar um processo que já vinha ocorrendo há anos.
No
entanto, o mais provável é que a grande maioria dos vinhos fique ligeiramente
diferente depois de abertos, mas não intragáveis a ponto de serem transformados
em molho de salada. Os taninos podem dar uma amaciada, o álcool e a cor podem
decair ligeiramente, mas sem prejudicar o conjunto, até mesmo em alguns vinhos
brancos.
Como
nenhum processo é absolutamente seguro, depois que a garrafa foi aberta, o vinho
do dia seguinte não será igual ao de hoje. Alguns críticos da bomba de vácuo
dizem
que o ar retirado da garrafa também altera os compostos voláteis e, por isso,
diminui o aroma dos vinhos. Então, para não correr esse risco, pode-se usar
garrafas de 375ml pré-esterilizadas para colocar o vinho que sobrou e então usar
a rolha original. Assim, diminui-se o contato da superfície do líquido com o ar.
Esse processo,
no entanto, praticamente equivale a uma decantação, pois o líquido foi
movimentado e todo passado em contato com o ar enquanto saia de uma garrafa e
entrava na outra, o que seria também um processo de oxigenação.
Nos
restaurantes que trabalham com muitos vinhos servidos em taças (infelizmente
ainda são raros no Brasil), a conservação é feita em aparelhos específicos -
servidoras de vinho - que não permitem a entrada de ar na garrafa já aberta ou,
em alguns casos, injetam uma pequena quantidade de nitrogênio e dióxido de
carbono, preservando o líquido. Claro que essas soluções não podem ser adotadas
em casa, uma vez que esses equipamentos ainda são grandes e caros, feitos
especificamente para lugares que movimentam muitas garrafas.
Porém, no
exterior, já estão à venda latas - que parecem com as de desodorante - com um
gás mais pesado do que o ar, que ocupa a parte superior da garrafa, impedindo o
contato do oxigênio.
Em
nossas casas o mais importante é: depois de comprar, deixar a garrafa descansar
ao menos um dia antes de ser aberta, abrir o vinho na temperatura correta,
beber com prazer e moderação, guardar na porta da geladeira o que restou
na garrafa depois de tirar o ar com a bomba e, no outro dia, tirar a garrafa
da
geladeira ao menos meia hora antes de consumir (para os tintos) e provar seu
vinho
com renovado prazer.
Fonte: Revista Adega
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