O inverno rigoroso e as baixas temperaturas registradas nos últimos meses em Santa Catarina prometem ajudar no desenvolvimento de uvas no campo e garantir vinhos de boa qualidade na próxima safra. Depois de perder 30% da colheita no primeiro trimestre deste ano por conta do clima, a expectativa das vinícolas catarinenses é de um dos melhores resultados da história no início de 2017. O objetivo é voltar ao patamar de crescimento anual de 20%, superando a média de 1,5 milhão de garrafas produzidas e R$ 300 milhões movimentados por ano na Serra e Meio-Oeste catarinense.
Em 2015, o inverno foi fraco. Vieram massas de calor antes da primavera e, em setembro, tivemos uma geada tardia que queimou a brotação. Houve uma das maiores perdas da história dos vinhos de altitude em Santa Catarina e no país — diz o presidente da Vinhos de Altitude Produtores Associados e diretor comercial da vinícola Villaggio Grando, Guilherme Grando.
Algumas vinícolas chegaram a ter 96% de quebra na produção. Com isso, a oferta das frutas no mercado brasileiro caiu, e o preço disparou. Agora, a expectativa é que o clima atue a favor dos produtores. Segundo Grando, o frio intenso e regular tem a função de manter as plantas em período de dormência, impedindo que elas brotem antes da primavera.
O secretário-adjunto de Agricultura em Santa Catarina, Airton Spies, afirma que os vinhedos catarinenses estão se beneficiando do frio intenso neste período de dormência. Como há previsão de pouca chuva e baixas temperaturas nos próximos meses, favorecidos pelo fenômeno La Niña, a projeção é de uma safra de boa qualidade.
Na vinícola Quinta da Neve, de São Joaquim, houve redução de 40% na safra colhida em 2016. O dono da empresa, Acari Amorim, projeta recuperação: Em 2015 tivemos uma produção baixa, com redução de quase 40%. Este ano tende a ser normal no clima e para a próxima colheita vamos ter uma safra muito boa, com ótima qualidade.
Queda nos termômetros também ajuda consumo
O frio mais rigoroso potencializa as chances de uma boa safra, mas os especialistas do setor reforçam que ele sozinho não é garantia de sucesso. Após uma hibernação satisfatória com as temperaturas baixas, o sol e o tempo mais seco nos meses antes e durante a colheita são fundamentais para a produtividade, a sanidade e a qualidade da uva.
O frio tem grande contribuição para o consumo. É até uma questão cultural: esfriou, as pessoas lembram do vinho e a demanda é maior. Já na produção, é preciso também de outros fatores para a safra ser positiva — explica o vitivinicultor e presidente do Sindicato da Indústria do Vinho de SC (Sindivinho), Celso Panceri.
Atualmente Santa Catarina tem cerca de 30 produtores de vinhos de altitude concentrados na Serra e no Meio-Oeste, sendo que 20 deles têm marcas no mercado. São aproximadamente 600 hectares e 2 mil empregos diretos e indiretos.
Reflexo das perdas começa a aparecer no mercado
O reflexo das perdas da safra pode demorar até três ou quatro anos para aparecer no mercado consumidor. Porém, em algumas variedades de vinho, esse impacto é mais rápido e alguns produtos começam a ter escassez de oferta.
Nos tintos é mais fácil absorver, porque muitas vezes se trabalha com produtos em barricas e se consegue misturar mais de uma safra. Mas vinhos brancos e espumantes geralmente são produzidos e colocados no mercado rapidamente. Então, já começou a faltar e só vai recuperar ano que vem — afirma Guilherme Grando.
Uma forma de evitar que a falta de frio impacte as produções e o mercado é o uso de produtos que atuam como reguladores de crescimento vegetal na hora do cultivo. Pulverizados antes da brotação, eles ajudam a compensar a falta de horas-frio necessárias para quebrar a dormência no fim do inverno.
Isso auxilia caso não tenha ocorrido frio suficiente, mas é importante o produtor buscar embasamento técnico para usar esse tipo de agrotóxico. Cada caso é específico então se deve buscar orientação antes de tentar — diz o engenheiro agrônomo e pesquisador em fruticultura da Estação Experimental da Epagri em Urussanga, Henrique Petry.
Condições geográficas influenciam nas características
O principal benefício do frio para a produção da uva é que, com a hibernação correta, a demanda metabólica vegetal diminui e a brotação tende a ocorrer com mais facilidade e vigor. Isso pode afetar a qualidade da fruta colhida e, consequentemente, do vinho produzido, mas o impacto é indireto.
Há uma melhor brotação, mais vigorosa, provavelmente com cachos maiores. Com frio suficiente no inverno e uma primavera mais amena, aumenta o potencial, mas a qualidade em si depende do manejo de todo o ciclo produtivo e das condições climáticas até o momento da colheita – afirma Petry.
O solo e a altitude da região de plantio também interferem na qualidade da uva colhida. Em regiões como a Serra catarinense, que tem amplitude térmica marcante, com dias mais quentes e noite frias mesmo no verão, as frutas adquirem uma alta concentração de compostos fenólicos, que dão cor ao vinho, e aromáticos, responsáveis pelo cheiro.
Fonte: Diário Catarinense
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