sexta-feira, 4 de dezembro de 2015

Gripe enogastronômica começou na Espanha

As escolas de gastronomia se multiplicam mundo afora, os livros tornam-se best-sellers quase instantaneamente, a tecnologia enogastronômica dá saltos quase impossíveis de serem acompanhados, os grandes chefs são celebridades internacionais e os vinhos alcançam preços estratosféricos. Tudo isso (ou quase) começou na Espanha, que está no epicentro da efervescência enogastronômica mundial.
 
Esta "gripe enogastronômica" que contagia o mundo nos dias atuais teve sua origem no que chamamos de "Revolução Espanhola". Depois de 40 anos sob rígido controle do estado, com supressão de liberdades, o criativo povo espanhol estava explodindo de ideias, e a entrada do país na Comunidade Econômica Europeia (em meados da década de 1980), que proporcionou os recursos financeiros necessários - além da reconquista da liberdade -, foi a centelha para a "Revolução Espanhola".
 
Enquanto na gastronomia chefs como Juan Mari Arzak e Pedro Subijana lançavam as bases e a fundamentação do movimento "La Nueva Cocina Española", - que mais tarde seria encabeçado por Ferran Adriá; na enologia, as técnicas de vinificação e cultivo começaram a ser atualizadas.
 
Foram introduzidas novas cepas, e as locais foram aperfeiçoadas; as técnicas de irrigação e mecanização se modernizaram, possibilitando a inclusão, em termos qualitativos, de novas áreas de produção. Regiões como Rioja e Ribeira del Duero, até então hegemônicas, tiveram de alargar os passos rumo à modernidade de forma a acompanhar zonas emergentes como o Priorat e Toro, por exemplo.
 
O segredo espanhol
 
Juntamente com a avalanche gastronômica, os vinhos espanhóis caíram nas graças dos consumidores mundiais. O segredo do sucesso da Espanha foi o não rompimento com as tradições locais, harmonizando o rústico e o sofisticado, o técnico e o caseiro e, principalmente, o novo e o tradicional. Em termos enológicos, esta associação entre o novo e o tradicional é clara na combinação entre as novas técnicas de plantio, cultivo, colheita, manuseio e vinificação e a utilização intensiva do carvalho na maturação dos vinhos.
 
A cultura do carvalho é tão arraigada que em algumas regiões há regras definidas e denominações específicas para os vinhos em função do período que permanecem em maturação na barrica e na garrafa (Crianza, Reserva e Gran Reserva).
 
Por séculos, a madeira é utilizada como material de armazenamento e transporte de vinhos, mas sua utilização como recipiente para maturação é bem mais recente.
 
O efeito do carvalho no vinho e na gastronomia
 
A utilização de barricas de carvalho no processo de envelhecimento cria condições favoráveis para que os componentes do vinho se desenvolvam e para que a madeira transmita características gustativas específicas ao vinho. Além disso, as barricas são importantes aliadas dos vinhateiros nos processos de clarificação e estabilização do vinho.
 
A suavização dos taninos através de um lento processo de oxidação e o aumento da complexidade do vinho pela adição de características relacionadas à madeira também são subprodutos esperados do processo de envelhecimento em barrica.
 
No campo da harmonização, a utilização maior ou menor da madeira no processo evolutivo do vinho deve sempre ser levada em conta, visto que os efeitos sobre os aromas e sabores do vinho podem ser relevantes.
 
Se fôssemos entrar nos detalhes químicos, teríamos de descrever os efeitos da lactona, da vanilina, do terpeno, da lignina e dos fenóis, mas, para o nosso propósito, basta termos em mente que a utilização do carvalho no envelhecimento do vinho agrega sabores de baunilha, coco, especiarias, defumados, cravo, caramelo, entre outros.
 
INTENSIDADE DOS SABORES DA MADEIRA
 
A intensidade da transferência de sabores ao vinho está relacionada a uma série de fatores, dentre os quais:
  • o tipo de madeira - apesar de o carvalho ser a madeira amplamente dominante, existem diversos tipos de carvalho subdivididos entre os grupos americano, francês e leste europeu, cada qual associado a um perfil gustativo diferenciado;
  • a técnica de confecção da barrica - neste item são vários os fatores a influenciar a característica de transmissão de sabores: a forma como as pranchas de madeira são cortadas, o método de secagem das pranchas e o grau de aquecimento e torra das barricas;
  • o tamanho do recipiente - evidentemente, quanto maior a superfície de contato entre vinho e madeira, maior o impacto na transmissão de sabores;
  • a idade do recipiente - quanto mais novos os recipientes, maior a intensidade aromática. A capacidade de transmissão declina com o tempo e a quantidade de uso dos recipientes;
  • o tempo de permanência no recipiente - a influência da madeira no caráter do vinho também está direta e positivamente relacionada ao tempo em que o vinho permanece no recipiente.
 
Por: Carlos Cordeiro
Fonte: Revista Adega

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