quinta-feira, 12 de maio de 2016

Vinho de talha do Alentejo é "mina de ouro" que Portugal deve aproveitar

"O vinho de talha tem um grande potencial. É uma mina de ouro, Portugal e o Alentejo têm de aproveitá-la", defendeu à agência Lusa o especialista Paul White, à margem do 10.º Simpósio de Vitivinicultura do Alentejo, em Évora.
 
 
Em "muitas partes do `novo mundo`, as pessoas amadureceram o seu consumo de vinhos, entraram numa fase mais adulta, e estão agora mais recetivas a este tipo de vinhos, diferentes dos tradicionais", afirmou o também crítico de vinhos e que escreve em revistas do setor.
 
"Há 10 ou 12 anos, toda a gente queria vinhos frutados, mas, agora, a audiência global para os vinhos alterou-se. Querem vinhos como os de talha, que acompanhem melhor a comida e que tenham um sabor mais mineral e vegetal, mais complexo, sem tanta fruta ou notas de carvalho", argumentou.
 
Paul White, que falou hoje no simpósio, precisamente, sobre o vinho de talha e as novas tendências do mercado mundial de vinhos, realçou à Lusa que Portugal deve apostar neste antigo método de produção vinícola, no Alentejo usado sobretudo para vinhos brancos, antes que outros países "corram" nessa direção.
 
"Na zona onde vivo, na Nova Zelândia, há duas pequenas adegas e já têm duas talhas. E a maior empresa de vinhos do país também já tem algumas talhas. A minha previsão é que, dentro de 10 anos, quase todas as adegas por todo o mundo tenham talhas e comecem a produzir estes vinhos", alertou.
 
Em Portugal, segundo a Comissão Vitivinícola Regional Alentejana (CVRA), o "grande guardião" dos vinhos de talha tem sido o Alentejo, que soube "preservar até aos dias de hoje este processo de vinificação desenvolvido pelos romanos" e que terá chegado à região há dois mil anos.
 
A CVRA explicou hoje à Lusa que, neste processo, as uvas esmagadas são colocadas dentro das talhas de barro e ficam a fermentar, durante vários meses, em cima das massas formadas pelas películas do fruto, saindo depois o líquido para o exterior, através de uma torneira, límpido e puro.
 
"O contacto do líquido com essas massas que ficam no fundo, obviamente, vai conferir-lhe características diferentes", além de que o vinho ganha "outros aspetos também diferenciadores" por a fermentação acontecer num recipiente em que "o material, o barro, apesar de revestido, tem porosidade", disse o presidente da CVRA, Francisco Mateus.
 
Este conjunto de características "não é possível replicar num ambiente de produção mais massiva", disse, referindo que, na talha, "fica-se com um vinho antigo, que marca a diferença nos tipos de vinhos que existem hoje em dia".
 
A CVRA, em 2011, reconheceu este método de produção e incluiu o vinho de talha na Denominação de Origem Alentejo, passando a assegurar o seu controlo de origem, ou seja, que é feito com uvas da região, e a certificar a qualidade do mesmo.
 
"Este era um método que, se calhar, não era tão conhecido no passado, era mais conhecido só em termos locais, mas começa, hoje em dia, a ganhar alguma expressão", destacou Francisco Mateus.
 
De acordo com dados da CVRA fornecidos à Lusa, no primeiro ano de certificação, foram produzidos 3.200 litros de vinho de talha. Esse número "tem aumentado gradualmente" e, no ano passado, a CVRA já certificou "quase 44 mil litros", ou seja, "12 vezes mais do que em 2011".
 
No ano passado, acrescentou o organismo, 20% do volume de vinho de talha "Alentejo" comercializado teve como destino a exportação, para países como os Estados Unidos, o Brasil, Angola e Suíça.
 
"Ainda são quantidades pequenas de um vinho de nicho de mercado, mas já vemos produtores de maior dimensão a produzirem vinho de talha, que antes era apenas um produto tradicional ou familiar, feito por pequenos produtores", pelo que "isso é bom" e pode contribuir para, nos mercados internacionais, "o Alentejo mostrar a sua diferenciação", argumentou o presidente da CVRA.

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