quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

O Brasil aprende a beber espumante e valoriza o produto ‘feito em casa’

A primeira surpresa quando se toma um espumante produzido no Brasil vem do paladar. O sabor, normalmente leve e fresco, cumpre bem o papel de um vinho dessa categoria. A segunda, possivelmente, será seu cérebro confuso - ainda na primeira taça - não lá pelo final da garrafa, quando qualquer confusão já é de se esperar. O levantar de sobrancelhas é fatalmente precedido pela pergunta: Mas é brasileiro?
 
 
Sim. O país da cachaça anda desbravando outros mercados etílicos e não é de hoje. Há algumas décadas descobriu-se que a região sul do Brasil tem solo e clima propícios para a produção de espumante. Calor na medida, chuva abundante e relevo irregular tornam algumas cidades do Rio Grande do Sul, estado que faz fronteira com a Argentina, grandes produtoras dessa festejada bebida. “Na década de 1970, com a chegada de empresas como a Chandon no Brasil, descobriram que o terroir brasileiro era bom para a produção de espumante”, explica o diretor-superintendente da Miolo, Adriano Miolo. “Hoje, trabalhamos para que todos os bares e restaurantes comercializem a bebida, para que beber espumante faça parte do dia a dia e não apenas de comemorações especiais”, diz.
 
Esse trabalho tem rendido bons frutos. De acordo com o Instituto Brasileiro do Vinho (Ibravin), as vendas de espumante cresceram exponencialmente na última década. Enquanto em 2002, o consumo de espumante nacional foi de 4,2 milhões de litros, em 2012 esse número saltou para 14,7 milhões de litros. Entre os estados que mais compram a bebida, São Paulo lidera, representando 28% do mercado.
 
Além do investimento das vinícolas em tecnologia, da geografia e da meteorologia, que tratam bem as uvas, outro fator também está a favor do consumidor na hora de abrir um espumante. “O nosso clima não favorece o vinho tinto. Como abrir uma garrafa de vinho tinto nesse verão? Está fazendo uns 34 graus lá fora!”, diz a nutricionista e sommelier, Erika Mesquita, do Triângulo Mineiro, no Estado de Minas Gerais, na região sudeste do Brasil. Com a forcinha que o clima pode dar, as produtoras de vinho perceberam, na virada do milênio, que havia um nicho a ser explorado. “Foi nessa época que todo mundo saiu para comprar algum espumante para brindar o reveillon, já que não sabiam se o mundo ia acabar ou não”, brinca a diretora-executiva da vinícola Salton, Luciana Salton.
 
O clima ajuda, mas os especialistas concordam que o brasileiro está mais aberto para experimentar outras bebidas - além da cerveja -, e com mais dinheiro para gastar. “Há uma certa incorporação do espumante no consumo. Antes era bebida de festa, agora não”, explica Salton. E as vinículas já sabem bem desse novo hábito do brasileiro. Por isso, hoje, mais de 50 produtoras fazem espumante no Brasil. Não é para menos que mais de 70% dos espumantes consumidos no país são made in Brazil. Preocupada em abastecer esse mercado cada vez mais sedento, a Salton, maior vinícola de espumantes do país, prevê que a produção de borbulhas neste ano alcance oito milhões de garrafas.
 
E, a cada ano, o espumante brasileiro recebe pontuações e boas críticas de experts da bebida em todo o mundo. Recentemente, o Vale dos Vinhedos, localizado na Serra Gaúcha, entre os municípios de Bento Gonçalves, Garibaldi e Monte Belo do Sul, recebeu o selo de Denominação de Origem, o que significa que os vinhos produzidos nessa região devem obedecer a regras específicas em relação à plantação da uva e elaboração do vinho, além de valorizar as peculiaridades da região. Para se ter uma ideia, o champagne, produzido na região de Champagne, na França, só leva este nome porque também tem um selo de Denominação de Origem.
 
O espumante brasileiro, a cada taça, avança como uma bebida mais reconhecida e peculiar. Inclusive no exterior. No ano pasado, 18,7% da produção nacional foi para o mercado externo, o equivalente a 172 000 litros. Em 2011, a exportação tinha representado 12,7% da produção local, o que comprova que não só os brasileiros se deleitam com a bebida nacional.
 
“Como o espumante brasileiro ganhou vários prêmios na França, ele está em paridade com os vinhos franceses”, compara o sommelier Frank Bischoff, que ao longo de seis anos trabalhando em uma loja de vinhos de São Paulo, viu a oferta de espumantes nacionais crescer 60% nas prateleiras.“Os críticos de vinho estão falando muito lá fora sobre o espumante brasileiro. Existe o champagne da França, o prosseco da Itália e a Cava da Espanha, mas faltava algo novo, algo do novo mundo, e o Brasil chega para tomar esse espaço”, explica a supervisora de importação da Aurora, Rosana Pasini. No que depender do consumo cada dia maior, os produtores podem colocar o espumante para gelar.
 
Por: Marina Rossi
Fonte: El País

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