segunda-feira, 28 de dezembro de 2015

Espumante leve e refrescante para seu réveillon #cbe

O réveillon está batendo a porta e aproveitando a oportunidade o Gil Mesquita, do blog Vinho para Todos, sugeriu como tema para Confraria Brasileira de Enoblogs - CBE: "Espumante de boa relação qualidade x preço, para brindar a chegada de 2016 com muitas garrafas".
 
Quando falamos em espumante com boa qualidade e bom custo pensamos logo no produto brasileiro, então minha escolha não poderia ter sido de outro lugar que não do Brasil.
 
Optei pelo Casa Perini Brut, um espumante produzido em Garibaldi pela Vinícola Perini, cuja história na produção de espumantes iniciou-se em meados da década de 90.
 
Trata-se de um espumante produzido pelo Método Charmat (segunda fermentação ocorre em tanques de aço inox) com as castas chardonnay e riesling itálico e que já recebeu inúmeras premiações em concursos nacionais e internacionais.
 
Na taça apresentou cor amarelo palha com reflexos dourados, boa formação de espuma e perlage fina, abundante e persistente.
 
No nariz mostrou aromas intensos de frutas como pera, pêssego e lichia e flores brancas, seguidos de notas de fermento e pão torrado.
 
Em boca apresentou leveza e acidez refrescante. Final de boca repetindo as sensações olfativas e mostrando boa cremosidade.
 
Um espumante bem feito, leve e refrescante que vai te agradar com certeza e ainda vai deixar sua virada de ano mais alegre.
 
Por aqui eu e Fernanda harmonizamos com bolinho de bacalhau!


O Rótulo

Vinho: Casa Perini Brut
Tipo: Espumante
Castas: Chardonnay e Riesling Itálico
Safra: Não safrado
País: Brasil
Região: Garibaldi
Produtor: Perini
Graduação: 12%
Onde comprar: Ingá Vinhos Finos
Preço médio: R$ 32,00
Temperatura de serviço: 6° a 8°

sábado, 26 de dezembro de 2015

Quais os problemas que se pode encontrar nos vinhos?

Os avanços na tecnologia, a abordagem mais científica em todas as etapas da produção e a conquista de diversas certificações de qualidade tornaram a elaboração de vinho um processo bem controlado e higiênico. Os investimentos em pesquisa e inovação com estes objetivos são consideráveis - uma vez que, o mercado comporta-se de forma bastante rigorosa - e mídia, críticos e degustadores profissionais exercem influência direta sobre o consumo.
 
Um produtor responsável não pode correr o risco de colocar no mercado um vinho com defeitos, com sabor e aroma desagradáveis ou impróprio. Em casos extremos, pode-se perder uma safra, o que significa perder um ano de rendimento, além dos "arranhões" na imagem da marca.
 
Embora uma variedade de recursos enológicos aplicados na atividade vitivinícola tenha eliminado muitos dos defeitos comumente encontrados em vinhos de outras décadas, alguns "defeitos" - quando presentes de forma sutil - podem ser interpretados como qualidade (por mais contraditório que isto possa parecer).
 
A seguir, verificaremos os principais problemas que podemos encontrar no vinho, como eles se manifestam e, se possível, o que podemos fazer para evitá-los ou repará-los.
 
Bouchonée
 
Também conhecido como "defeito da rolha", é um problema que atinge cerca de 5% das garrafas de vinho no mercado, algo equivalente a mais de 1 bilhão de recipientes a cada ano. O próprio nome descreve a forma de identificação deste distúrbio: o cheiro de rolha, papelão molhado ou mofo.
 
A principal substância responsável por esta contaminação é o 2,4,6-tricloroanisol, ou apenas T.C.A. Substâncias congêneres como o tetracloroanisol ou o tribromoanisol também provocam os mesmos sintomas no vinho.
 
Embora a rolha de cortiça natural seja identificada como a maior culpada por este defeito, não se trata da única vilã. O T.C.A. é o resultado da presença de um fungo - como o Penicilium ou o Trichoderma, que estão livres no ambiente e consequentemente nas madeiras (tanto das instalações vinícolas, quanto das barricas e rolhas) - somado ao contato com substâncias cloradas, facilmente achadas em produtos para tratamento e limpeza de madeiras, e fenóis, naturalmente encontrados nas rolhas. Da junção destes três fatores, desenvolve-se o T.C.A.
 
Este defeito não pode ser observado a olho nu. Embora não cause nenhum dano à saúde humana, não há forma de se tratar e corrigir.
 
Brettanomyces
 
Brettanomyces é uma família de leveduras que pode atacar o vinho ou o mosto em fase final de fermentação. Popularmente chamada de "Brett", esta levedura produz aromas de couro, suor e bacon. No entanto, quando levemente presente, sem encobrir o caráter da fruta, pode adicionar complexidade ao fermentado. Podemos observar isto em muitos dos principais produtores do Rhône.
 
A "Brett" encontra predisposição especial para agir em vinhos com alto pH (baixa acidez) e teor alcoólico. Sendo assim, raramente a encontramos em vinhos brancos. Ainda não existe uma forma de corrigir este problema. Pode-se atuar apenas preventivamente durante a vinificação com a correta aplicação de sulfitos.
 
Oxidação
 
Oxidação é o processo em que o oxigênio atua como catalisador de uma série de reações indesejáveis e irreversíveis no vinho. Neste caso, como na "Brett", uma leve presença pode ser interpretada como qualidade e até tipicidade, como é o caso de alguns ícones da Espanha. De forma geral, a oxidação pode ser notada visualmente por dar aos vinhos brancos tonalidades acastanhadas e douradas muito intensas e, aos tintos, tons alaranjados e âmbar.
 
Uma série de substâncias podem ser indicativas de oxidação:
 
Acetaldeído - presente em pequenas quantidades, pode contribuir para a complexidade do vinho, como no caso do Jerez. O ataque de leveduras aeróbicas, normalmente da família Saccharomyces, transforma o álcool, glicerina e ácido málico dos vinhos em acetaldeído. Em maior presença, caracteriza-se pelo forte odor de amêndoa, além da ausência de acidez e maciez no vinho.
 
Os tintos, por conter maior teor de polifenóis, são menos suscetíveis a esta doença. Os tratamentos e correções somente podem ocorrer na vinícola, na fase de produção.
 
Acidez volátil - termo popularmente utilizado para descrever a presença de ácido acético no vinho. Embora a acidez volátil deva ser representada por uma série de ácidos voláteis, o ácido acético constitui cerca de 96% desta medida e, por isso, costuma-se utilizar apenas o termo acidez volátil. O ácido acético é produzido pela bactéria acética ou acetobacter, que age sobre o álcool, na presença de oxigênio. Este ácido não apresenta nenhum aroma característico, sendo mais facilmente identificado pelo sabor acre e levemente adocicado.
 
Etil acetato - é um éster responsável pelo aroma normalmente ligado ao vinagre. Resultado da reação do ácido acético com o álcool, o etil acetato, quando notado no vinho, apresenta odor nítido de vinagre e acetona.
 
Cozimento ou madeirizado - em clara referência ao processo de produção do Vinho da Madeira, esta oxidação se desenvolve pelo aquecimento prolongado do fermentado. Com calor moderado e prolongado, as reações químicas dos compostos orgânicos se desenvolvem de maneira acelerada, dando ao vinho tons amarronzados e aroma que remete ao caramelo.
 
Redução
 
Trata-se do fenômeno inverso ao da oxidação. São reações químicas que se desenvolvem em ambientes livres de oxigênio. No caso do vinho, quando se aponta que está "reduzido", ou com "aroma de redução", significa que compostos sulfúricos indesejáveis foram produzidos.
 
Certas leveduras, diante de condições extremas de carência de nutrientes no produto, passam a se alimentar de aminoácidos que contêm enxofre, produzindo estes compostos indesejáveis, como o sulfeto de hidrogênio (H2S), mercaptanos e tióis. Vale lembrar que a incidência de iluminação direta por período prolongado pode acelerar o processo de produção destas substâncias, um mal conhecido como "gosto de luz" (goût de lumière).
 
O sulfeto de hidrogênio possui o aroma característico de ovos cozidos em excesso (alguns chegam a falar em cheiro de ovo podre). Por se tratar de um gás bastante volátil, normalmente agitando-se o vinho na taça ou decantando a garrafa conseguimos eliminar este problema.
 
Mercaptanos também são compostos sulfúricos e podem ser produzidos pela ação de leveduras nos aminoácidos do vinho ou nas moléculas de sulfeto de hidrogênio. Caracteriza-se por manifestar aromas de gás de cozinha, alho e repolho. Por ser menos volátil que o sulfeto de hidrogênio, com a agitação ou decantação, consegue-se diminuir seus efeitos, porém dificilmente eliminá-los.
 
Tióis e outros dissulfitos são originados a partir da oxidação de mercaptanos. Podem ser identificados pela presença de aromas de borracha e borracha queimada, e são defeitos permanentes, não podendo ser corrigidos.
 
Estes compostos sulfúricos, quando presentes abaixo do nível de percepção humana, podem produzir o efeito de "apagar" os aromas do vinho, deixandoos sem expressão.
 
Pesquisas, porém, indicam que compostos à base de enxofre podem causar dores de cabeça em pessoas alérgicas a esta substância.
 
Cristais e borras
 
Não são defeitos. Cristais de tartarato podem indicar um processo de estabilização leve ou sua ausência. Já as borras ocorrem naturalmente com a evolução dos vinhos tintos e alguns fortificados em garrafa. Também denotam pouca ou nenhuma estabilização e filtração. Ambos não oferecem risco quando ingeridos.
 
Defeito ou não?
 
A lista contempla apenas os principais defeitos que podemos encontrar no vinho atualmente. Através dela, podemos ter uma noção dos inúmeros cuidados que os produtores devem tomar para disponibilizar um vinho "são" ao mercado, assim como o consumidor pode constatar a presença de algum defeito.
 
Agora, grande polêmica surge em torno do assunto quando levantamos a hipótese de fazer uso de todos os recursos disponíveis para a produção de um vinho sem defeitos. Não se estaria produzindo fermentados padronizados, quase pasteurizados? Vinhos que, devido a um intenso tratamento e manipulação, perderiam seu senso de terroir e não transmitiriam nenhuma filosofia de trabalho de seu produtor? Talvez os pequenos defeitos aproximem os produtos de uma condição mais humana, falível; às vezes interpretados até como qualidade, como complexos.

Por: Marcel Miwa
Fonte: Revista Adega

Tanino é um dos componentes mais importantes do vinho

Muito tânico" ou "pouco tânico". Quando comentamos sobre vinhos, geralmente ouve-se expressões como essa. Mas, o que significa para um fermentado ser tânico? Aliás, o que é o esse tão falado tanino? Como ele age no vinho em relação ao sabor, longevidade? Quais uvas possuem mais tanino? Como fazer para suavizá-los ou realçá-los? A respostas para estas e outras perguntas você encontra a seguir.
 
O que é esse tal tanino? Um instrumento de defesa da planta
 
Tecnicamente, o tanino corresponde a um grupo de compostos fenólicos que tem como principal característica a afinidade em se ligar à cadeias de proteínas e precipitá-las. Encontrados principalmente nas partes lenhosas, "nas folhas e em frutos não maduros de muitas plantas, eles atuam como instrumento de defesa. Quando um predador começa a ingerir partes de uma planta, as células vegetais rompidas liberam os taninos, que possuem sabor amargo e provocam grande adstringência, causando repugnância ao predador.
 
Tanino nas uvas
 
Nas uvas, os taninos encontram-se principalmente nas cascas, sementes e engaços. Assim como os açúcares da uva, eles também passam por um amadurecimento e, conforme se atinge esta maturidade, perdem agressividade, tornando-se macios e sedosos.
 
Dentre as uvas viníferas, geralmente, quanto mais grossa a casca, maior a quantidade de taninos a serem extraídos. Este é o caso da Cabernet Sauvignon, Tannat, Nebbiolo, Baga, Petit Verdot, Sangiovese Grosso; só para citar algumas. No extremo oposto estão variedades de cascas mais finas, que dão origem a vinhos de estrutura mais leve e textura delicada. As variedades Pinot Noir, Gamay e Cabernet Franc (apesar de dominar o blend do mítico e longevo Château Cheval Blanc) se enquadram nesta tipicidade.
 
Os taninos das uvas são classificados como condensados ou proantocianidinas. A outra classificação a qual eles podem pertencer é denominada taninos hidrolisáveis ou elagitaninos, e correspondem aos que são extraídos da madeira do carvalho. Cada um possui uma natureza diferente e, embora ainda não mapeado cientificamente, desencadeiam uma série de reações distintas no vinho.
 
A maturação dos taninos, além do acompanhamento dos níveis de açúcares e acidez, é o fator chave para se decidir o momento ideal da colheita da uva, atualmente.
 
Tanino no vinho
 
A vinificação talvez seja o momento mais importante para analisar os taninos que encontramos nos vinhos. Quase todas as etapas de vinificação influenciam na tanicidade do vinho: maceração pré-fermentativa, medida do tanque de vinificação, temperatura e tempo de fermentação, forma de "romper" o chapéu, passagem por barricas de carvalho, maceração pós-fermentativa, micro-oxigenação e filtração/clarificação são as principais fases que possuem relevância na extração dos taninos.
 
É importante fazer a ressalva de que estamos tratando de tintos. Os brancos apresentam quantidades muito inferiores de taninos, uma vez que a fermentação se dá, via de regra, sem a presença das partes sólidas das uvas, de onde se extraem a maior parte dos taninos.
 
Taninos em cada etapa de vinificação
 
Em linhas gerais, seguimos com a descrição da forma que cada uma das etapas de vinificação citadas podem influenciar na extração dos taninos para o vinho:
 
1- Maceração pré-fermentativa
 
Esta técnica corresponde ao contato das cascas das uvas com o mosto ainda não fermentado. Uma vez que as uvas são prensadas, deixa-se o mosto em contato com as cascas em ambiente com baixa temperatura. Desta forma, consegue-se extrair mais compostos aromáticos, sem uma excessiva extração de taninos.
 
2- Tanques de fermentação
 
O tamanho e o formato são relevantes para se verificar uma maior ou menor aptidão para extrair compostos das partes sólidas. De maneira simples, quanto maior a relação largura/ altura, maior será a superfície de contato entre o mosto e os sólidos, portanto, maior a aptidão para se extrair os taninos.
 
3- Temperatura e tempo de fermentação
 
Via de regra, quanto maior a temperatura de fermentação, maior será a extração dos componentes das cascas. Assim, logicamente, quanto maior o tempo de contato do mosto com os sólidos das uvas, maior será também a extração dos taninos. Com o calor, as células vegetais se rompem, liberando mais facilmente todos os seus extratos. Neste caso, a parcimônia é fundamental: calor excessivo pode matar as leveduras, acelerar reações químicas, inclusive da acetificação (avinagrar) e provocar a volatilização de muitos compostos aromáticos.
 
4- Forma de "romper" o chapéu
 
Com o início da fermentação, o CO2 produzido impulsiona toda a massa sólida para a parte superior do recipiente de fermentação. Com o intuito de maximizar o contato dos sólidos com o líquido, existem várias formas para aumentar a interação destas duas partes. Duas das principais são: a remontagem e o pigeage.
 
Na primeira (remontagem), drena-se o líquido na parte inferior do tanque, através de bombeamento ou meios gravitacionais, e é feito seu transporte até a parte superior, onde promove-se uma espécie de "rega" do chapéu. O líquido regado, atravessa lentamente a barreira sólida extraindo todos os seus componentes.
 
Na segunda (pigeage), utiliza-se uma ferramenta chamada pigeou, um largo disco com longo cabo, que promove a imersão da massa sólida na parte líquida. Em alguns casos, abdica-se das ferramentas para utilizar o próprio pé humano, como no caso da pisa a pé, nos tradicionais vinhos do Porto.
 
5- Barricas de carvalho
 
Barricas de carvalho agem nos taninos de duas formas. A primeira maneira (que será pormenorizada mais adiante neste artigo), é a microoxigenação. Os poros do carvalho permitem uma leve penetração de ar, que ajuda na polimerização dos taninos e na formação de polímeros pigmentados (reação entre taninos e antocianinas).
 
A segunda forma é aportando mais taninos ao vinho. A madeira do carvalho também é rica em taninos (tão rica que as próprias tábuas de carvalho devem passar por um envelhecimento, em torno de três anos, para que percam um pouco dos taninos, bem como a umidade). Seus taninos são de natureza diferente dos da uva. Os do carvalho, chamados de elagitaninos ou taninos hidrolisáveis, também são particularmente solúveis em álcool e água. Uma vez que o vinho entra em contato com a parede da barrica, principalmente as de primeiro uso, ocorre a extração dos elagitaninos que passam a integrar o fermentado, dando um maior suporte estrutural.
 
6- Maceração pós-fermentativa
 
Ao contrário da pré-fermentativa, o que se busca neste caso é justamente uma maior extração de taninos. Taninos são facilmente solubilizados em meios alcoólicos. Uma vez encerrada a fermentação, prolongase o tempo que o mosto fermentado permanece em contato com as cascas para uma maior extração de taninos e antocianos.
 
7- Micro-oxigenação
 
Consiste na técnica de aplicar um pequeno volume de gás oxigênio ao vinho já fermentado, numa proporção média de 1 ml de oxigênio por litro ao mês. Seria uma forma de emular a leve aeração que as barricas de carvalho permitem, tornando os taninos mais macios e o vinho mais estável. Normalmente, esta técnica é utilizada para fermentados ricos em taninos e antocianinas, para que se tornem mais estáveis e mais palatáveis ao degustador que prová-los ainda jovens.
 
8- Filtração e clarificação
 
Há muitos tipos de filtros utilizados na vinificação, no entanto, os objetivos são coincidentes: retirar micropartículas que podem comprometer a qualidade ou a apresentação do vinho.
 
Por exemplo, em vinhos engarrafados com açúcares residuais, a filtração é particularmente utilizada para retenção de leveduras e bactérias, que poderiam continuar agindo no vinho mesmo após o engarrafamento. Quanto aos taninos, caso a filtração seja muito intensa e rigorosa, parte poderá ficar retida nas membranas dos filtros, já que se tratam de cadeias moleculares longas. Além disso, a intensa agitação contida neste processo pode acelerar reações químicas envolvendo os taninos.
 
A clarificação é o processo que visa a separação de partículas sólidas e visíveis no vinho. Ela pode se dar por meios físicos, como a simples decantação (estamos falando da produção e não a decantação que se pode realizar no momento da degustação), ou pela ação de agentes externos. Estes agentes de afinamento normalmente são ricos em proteína, como o caso da clara de ovo, tradicional fator de afinamento. Considerando a principal característica dos taninos, de unir e precipitar proteínas, este processo também é utilizado para eliminá-los dos vinhos.
 
Taninos enológicos
 
São assim chamados os taninos industriais. Quando o enólogo julga que seu mosto ou vinho está com o conjunto carente de taninos, pode-se recorrer a estas preparações de tanino comerciais, que podem ser extraídos de inúmeras espécies de plantas. Embora se trate de tema polêmico, muitos produtores admitem seu uso, e estamos falando de grandes nomes da Borgonha, Bordeaux, Califórnia e Austrália (provavelmente de muitas outras regiões também).
 
Até o momento não existem pesquisas científicas que indiquem alguma diferença organoléptica entre taninos industriais e os naturais da uva. Tratase também de uma questão filosófica: os intervencionistas defenderiam que, se fosse para obter um vinho de melhor qualidade, seria válido; enquanto os puristas afirmariam que estariam deturpando a essência do fermentado.

Envelhecimento

Cientificamente, ainda pouco se sabe sobre as reações ligadas aos taninos durante seu envelhecimento em garrafa. Como exemplo, pesquisadores da Universidade da Califórnia não constataram nenhuma redução nos níveis de tanino num vinho de Napa Valley analisado na época do engarrafamento e novamente após envelhecido três anos.
 
Sabemos que a atuação dos taninos como antioxidante (aliás, o principal flavonol precursor dos taninos, a catequina, possui efeitos análogos ao resveratrol: captar radicais livres), proporcionam uma maior longevidade ao vinho. No entanto, o resultado de suas reações com as antocianinas (pigmentos) e a produção de novos compostos aromáticos ainda não é conhecida totalmente.
 
Degustação
 
Taninos, quando maduros, não possuem cheiro ou sabor. Citamos maduros, pois, quando verdes, podem estar associados a aromas excessivamente herbáceos e sabor amargo. A principal forma de avaliar taninos é pela textura. Devido à propriedade de precipitar proteínas, a sensação de adstringência e secura na boca nada mais é que os taninos precipitando a saliva, que é rica em proteínas.
 
Quanto mais maduros forem os taninos, menores serão os sintomas de adstringência e agressividade. Taninos maduros podem ser descritos como dotados de textura aveludada, como se o vinho contivesse inúmeras micropartículas sólidas, que não provocam nenhuma aspereza na boca, apenas contribuem com volume e peso.
 
Pesquisadores da AWRI (Australian Wine Research Institute) concluíram que os taninos da semente da uva são os mais agressivos e adstringentes, assim como os polissacarídeos (açúcares) diminuem sua sensação de adstringência.
 
Sob o aspecto gustativo, poderíamos dizer que os taninos atuam como a fundação de um prédio, enquanto os aromas representariam sua fachada. A beleza da fachada do prédio é imediata e evidente, assim como a exuberância dos aromas. Por outro lado, sem uma fundação adequada, o prédio não se sustenta, bem como os taninos dão coerência ao conjunto, acompanhando os imponentes aromas de uma sólida e harmoniosa estrutura em boca.
 
Tanino ou não tanino?
 
O perfil tânico de um vinho depende de inúmeros fatores, como variedade da uva, condições de safra e o trabalho do enólogo. Mais uma vez o fator chave é a coerência. Não se espera que um Beaujolais tenha uma estrutura tânica portentosa, tampouco que um Barolo não possua uma boa estrutura. Ainda assim, nos depararemos com algumas dúvidas, como provar um Borgonha de uma safra considerada difícil e encontrarmos uma belíssima estrutura tânica com um conjunto equilibrado. Será o caso de adição de taninos enológicos? Ou um trabalho acima da média deste produtor? Terá esta determinada comuna gozado de condições climáticas mais favoráveis que o resto da região? Estas dúvidas provocam um mergulho cada vez mais profundo neste instigante mundo do vinho.

Por: Marcel Miwa
Fonte: Revista Adega


Como o carvalho exerce influência nos vinhos

A influência da madeira no vinho é um assunto interessante e controverso. E quando se fala em madeira, automaticamente se pensa em carvalho. Não que outros tipos de madeira definitivamente não sejam utilizados na vinicultura – a cerejeira, por exemplo, é usada no Vêneto para envelhecimento dos Valpolicella Ripasso, por suavizar os polifenóis sem adicionar notas de baunilha –, mas o carvalho, por suas características, é a espécie mais apropriada. De fato, o carvalho é suficientemente flexível para a montagem de barris, pouco poroso, apresenta nível de taninos aceitável e traços aromáticos suaves, que não maculam o vinho com seu poder.
 
Na produção da bebida, barris são usados durante a fermentação alcoólica, malolática e o envelhecimento. Seu papel é enriquecer a bebida com novos componentes, agregando complexidade, e permitir que reações físicas específicas aconteçam. Os barris de carvalho não só agregam aromas e taninos ao vinho, mas também, por conta de sua porosidade, permitem que a bebida respire, desenvolva-se e amadureça. A forma como são utilizadas pelo enólogo é crucial e, a partir da mesma “ferramenta”, eles podem obter variados resultados.
 
“O uso do carvalho na vinicultura chega a ser cultural, vem de um conjunto de tradições, já que, no passado, os vinhos eram colocados em barris de madeira para transporte e proteção”, conta Rodrigo Perez Nambrard, gerente comercial para Espanha e América do Sul da Seguin Moreau, uma das maiores tonelarias do mundo.
 
Tipos de carvalho
 
O carvalho é uma árvore da família das Faias, de folha caduca, nativas das zonas temperadas da Europa, América do Norte e Ásia, cujos frutos são ricos em taninos. Dentre as mais de 250 espécies, as que melhor se prestam à fabricação de barris são: Quercus alba, também chamado de “carvalho americano” – os melhores estão na Pensilvânia, Minnesota e Wisconsin –, Quercus robur e Quercus petraea ou Quercus sessilis, encontrados na maioria das florestas francesas.
 
As duas espécies europeias usadas na indústria tanoeira têm características singulares. O Quercus robur, ou carvalho pedunculado, é rico em taninos, seu melhor descritivo aromático seria “feno” e sua granulação é larga. Já o Quercus petraea, ou carvalho séssil, é tido como o mais refinado, devido à granulação mais fina e à riqueza de compostos aromáticos, especialmente pelas notas de baunilha e especiarias, além de ser pobre em taninos.
 
A França é considerada a melhor fonte de carvalho na Europa. Desde o século XIX, o país é referência e isso se dá provavelmente porque lá estão as maiores e mais variadas reservas. Além disso, os franceses contam com um órgão próprio para cuidar da manutenção e gerenciamento das florestas, a Agência Florestal Francesa – ONF. A partir desse trabalho, garante-se não só a longevidade da produção de carvalho, mas também a qualidade. Na França, nenhuma árvore é considerada apta para a indústria tanoeira antes de completar 150 anos de idade. Essa padronização e a fiscalização têm relação direta com a boa fama do “carvalho francês”, pois a estrutura granular e a qualidade dos compostos fenólicos, que influenciarão o vinho produzido, estão garantidas. O carvalho francês é fino, rico e aromático, com taninos suaves.
 
“A atuação da ONF é bastante real e séria, tanto que as tanoarias, a exemplo da Seguin Moreau, devem, todos os anos, primeiro aguardar que o órgão informe quais parcelas de floresta de carvalho estão liberadas para extração, para somente então estudar a qualidade – espécies, diâmetro, idade das árvores etc – e planejar sua produção naquele ano”, afirma Nambrard. A partir daí, as áreas definidas vão a leilão dos quais participam as tanoarias.
 
Resumo do processo de produção de barris
 
1. Seleção e corte do carvalho em aduelas. Ao contrário do carvalho americano, que pode ser serrado, o carvalho francês somente pode ser “rachado”, ocasionando maior perda de matéria-prima (que pode se transformar em “staves” e “chips”);
 
2. As aduelas são levadas para o processo de secagem ao ar livre. Todos os lotes são etiquetados com informação sobre a origem e tipo da madeira;
 
3.Durante a secagem, ocasionalmente o carvalho é regado com água;
 
4. Depois de completo o período de secagem, que pode levar até 24 meses, a madeira está pronta para ser encaminhada à tanoaria, onde é montada conforme o formato/tamanho de barril desejado;
 
5. Após a montagem, passa-se ao tratamento térmico da madeira, quando é definido o tipo de tosta do barril;
 
6. Caso alguma aduela não tenha suportado o tratamento térmico, o barril é descartado;
 
7. Por fim, os barris passam por testes de estanquicidade, ou seja, são preenchidos com água quente sob pressão. Caso seja aprovado, o barril segue para a fase de acabamento (polimento, identificação, etc.).

 
 Origens e estilos
 
Entretanto, bons carvalhos europeus são encontrados em diversos países, tais como, Hungria, Romênia, Rússia e Polônia. E os tanoeiros levam mais em consideração a origem geográfica do carvalho do que sua espécie, já que cada um apresenta características diferentes. O húngaro costuma agregar sensação de volume e textura, enquanto o do Cáucaso dá taninos moderados e notas aromáticas ao vinho. Uma das regiões preferidas é a Slavonia (comumente confundida com a Eslovênia), localizada na Croácia, cujo carvalho é mais granuloso, o que proporciona uma maior micro-oxigenação e auxilia a integração dos diversos elementos do vinho, além de aumentar sua longevidade.
 
O “carvalho americano” é reconhecido por seu caráter aromático. Costuma agregar notas de baunilha, coco, manteiga e outros aromas adocicados ao vinho. Quando a tosta se dá em temperaturas muito altas, essas notas doces e frutadas dão lugar a traços de açúcar mascavo, caramelo e xarope de bordo.
 
Ao fogo
 
Falando em tosta, ela é parte do processo de fabricação de barris e tem relação direta com o sabor do vinho que passará pelo recipiente. Existem três níveis: leve (light), média (medium) e forte (heavy). Barris de tosta leve são usados por enólogos que buscam o caráter mais natural do carvalho. As de tosta média variam entre “true medium”, apropriada para a maioria dos tintos, e “medium plus”, as preferidas para fermentação de brancos. Por fim, a tosta forte tem caráter defumado-carbonizado e normalmente é usada em compostos de blends, a fim de não predominar.
 
Ao contrário do que se possa pensar, quanto mais fina a granulação do carvalho, maior a sua porosidade. Quanto maior a porosidade, maior a micro-oxigenação e, consequentemente, maior a ação positiva nos taninos do vinho. Em suma, quanto mais fina a granulação, melhor a reputação do carvalho junto aos enólogos. A maioria dos carvalhos europeus tem granulação bem mais fina do que a do americano. O carvalho das florestas de Tronçais, na França, cujos troncos são mais estreitos, apresenta a mais fina das granulações e portanto a melhor das reputações.
 
Outra diferença significativa entre os carvalhos francês e americano é a sua estrutura celular. O americano é mais denso e mais impermeável, por isso pode ser serrado. Já o francês precisa necessariamente ser partido, sem o uso de serras, a fim de manter os veios naturais da planta sem o risco de futuros vazamentos ao barril a que dê origem.
 
O custo do barril
 
Usar ou não barris de carvalho na fermentação e/ou envelhecimento de vinhos mais refinados e de alta gama tem mais relação com o estilo de bebida que se pretende obter do que com questões econômicas. Por outro lado, no caso de vinhos mais básicos e de menor custo, a decisão de se utilizar ou não madeira fatalmente passa pelas finanças, já que barris podem chegar a dobrar o valor do produto final.
 
De fato, eles não são itens baratos. Um barril de carvalho francês custa, em média, no mínimo US$ 850, dependendo da sua qualidade e capacidade – bons barris feitos a partir de carvalho vindo de florestas das regiões de Alliers, Vosges e Tronçais podem chegar a valer alguns milhares de dólares –, enquanto os de carvalho do leste europeu são comercializados a partir de US$ 550. Os de barris de carvalho americano são comercializados com preços a partir de US$ 400, também dependendo da sua qualidade e capacidade.
 
O motivo para essas variações de preço, além da região de proveniência da madeira, é a diferença estrutural entre as espécies de carvalho. Lembrando: para preservar sua integridade, o carvalho francês não pode ser serrado – o corte dos troncos é feito quase que manualmente, sempre no sentido das fibras, com cunhas de aço – e, assim, apenas 20% da matéria-prima é utilizada para a tanoaria. Por outro lado, no carvalho americano – de estrutura pouco permeável, que pode ser cortado com serra e em várias direções – o aproveitamento chega a, pelo menos, 40%. Ademais, enquanto, por ordem da ONF, o carvalho francês não pode ser cortado antes de 150 anos de idade, árvores de carvalho americano podem chegar ao ponto de corte já aos 60 anos.
 
Levando esses custos para a garrafa, de maneira bastante simplificada, um litro de vinho que passa em barrica tem seu custo acrescido do preço da barrica dividido pela capacidade da mesma. Ou seja, se a bebida passou por um barril bordalês de 225 litros que custou US$ 900, poderá haver um acréscimo de US$ 4 no preço final. Então, se, por um lado, esse processo agrega muito valor ao vinho, por outro eleva seu custo de produção.
 
Dentre as mais de 250 espécies de carvalho, as que melhor se prestam à fabricação de barris são: Quercus alba (carvalho americano), Quercus robur e Quercus petraea.
 
 
Alternativas às barricas
 
Por isso, enólogos de todo o mundo se utilizam de alternativas economicamente mais viáveis para que seus vinhos ganhem a complexidade e os aromas da madeira sem sofrer grande impacto de custo. Passar apenas uma parte do vinho por barris novos de carvalho é um dos expedientes disponíveis. Uma alternativa de custo ainda menor é a utilização de “chips” (lascas) ou “staves” (aparas de carvalho) durante o processo de produção.
 
Nesse caso, os chips ou staves são colocados em contato com o vinho. Isso pode acontecer em diversas fases, desde a fermentação do mosto até quando o vinho já está pronto. Chips e staves também podem variar consideravelmente tanto em relação à procedência (tipo de carvalho, tosta etc) quanto ao tamanho. Ademais, eles tanto são usados no lugar do período de envelhecimento em barris, quanto para suplementá-lo, nos casos em que o barril em questão for usado e se pretenda uma influência mais intensa de madeira.
 
É importante ressaltar que esse expediente confere atributos aromáticos à bebida, mas não pode ser considerado um substituto total dos barris, já que a passagem do vinho por barricas de carvalho possibilita a micro-oxigenação, processo que permite que moléculas de oxigênio penetrem na madeira e alcancem o vinho, ligando-se aos compostos de tanino mais pesados e fazendo-os precipitar no fundo do recipiente. Como resultado, o vinho tende a ficar mais redondo, aveludado e longevo.
 
Apesar de um pouco polêmico – e muitas vezes ocultado pelos produtores –, a utilização de chips de carvalho pela indústria vinícola vem de longa data. Há relatos a seu respeito datando de 1961, nos Estados Unidos. Esses expedientes foram e continuam sendo bastante utilizados em países produtores tanto do Velho quanto do Novo Mundo para se obter rótulos competitivos no mercado internacional. Aliás, a despeito do preconceito de alguns, é um artifício válido e, quando usado devidamente e de modo consciente, gera resultados muito mais que satisfatórios. Você, leitor, seria surpreendido pela quantidade de bons vinhos que não estagiam em barris propriamente ditos, mas sim se utilizam de chips ou de staves.
 
Quanto menos usado o barril, maior a sua influência, maior a transferência de aromas e sabores ao vinho nele armazenado.
 
Produtores de barricas
 
Atualmente, são produzidos cerca de 800 mil barris todos os anos ao redor do mundo e, desse total, cerca de 550 mil na França. A maioria é construída a partir de carvalho francês, mas algumas tanoarias francesas utilizam-se de carvalho americano e do leste europeu, do mesmo modo que algumas empresas americanas usam carvalho francês.
 
Sem dúvida, as tanoarias mais famosas do mundo e reconhecidamente produtoras dos barris de melhor qualidade estão localizadas na França. Entre as notáveis podemos citar Boutes, Cadus, Damy, Demptos, François Frères, Nadalié, Quintessence, Radoux, Rousseau, Saury, Seguin Moreau, Taransaud e Vicard. Esses produtores são verdadeiras grifes e, muitas vezes, uma espécie de atestado de qualidade dos vinhos que são armazenados nesses barris.
 
“O trabalho dos tanoeiros costuma ser bastante próximo ao dos enólogos. É comum a empresa ser procurada por enólogos dizendo: ‘Tenho esse vinho, esse potencial, o que podemos fazer?’ E, a partir daí, os dois profissionais discutem juntos qual o melhor tipo de carvalho, tamanho de barril, tosta etc, para se atingir o vinho idealizado. Muitas vezes, a partir deste trabalho, desenvolvemos barris customizados para clientes e vinhos”, conta Rodrigo Perez Nambrard, da Seguin Moreau. Para ele, antigamente, o carvalho era usado para diminuir os defeitos do vinho, mas, com o desenvolvimento da indústria e a simbiose entre tanoaria e vinicultura, os produtores conseguem hoje realmente aproveitar todo o potencial da barrica, com aporte de aromas e complexidade, por exemplo.
 
Além disso, a tanoaria costuma participar da história da evolução do uso do carvalho. Tomando como exemplo o Brasil, Nambrard lembra que “em 1998 praticamente não havia um conceito de barricas no país”, acrescentando que “as primeiras barricas da Seguin Moreau foram vendidas (para cá) em 2000/2001”. Desde então, o cenário se alterou muito e, novamente, faz parte do papel dos tanoeiros apoiar os produtores na aquisição e uso de barris adequados para que o vinho produzido desenvolva e demonstre seu maior potencial.
 
A vida do barril
 
Barris de carvalho podem, na verdade, ser usados mais de uma vez na produção de vinhos. Obviamente, o fato do barril ser novo ou usado faz diferença no produto final. Costuma-se chamar as barricas novas de “barricas de primeiro uso”, reutilizadas pela primeira vez “de segundo uso”, pela segunda vez “de terceiro uso” e assim por diante. Como regra geral, quanto menos usado o barril, maior a sua influência, maior a transferência de aromas e sabores ao vinho nele armazenado. A partir do terceiro uso, normalmente o impacto aromático do carvalho é muito pequeno, os barris são praticamente inertes e sua principal função passa a ser permitir a micro-oxigenação do vinho.
 
Assim, quando o objetivo do enólogo é imprimir real toque de carvalho ao vinho, o estágio se dá em barris de primeiro ou segundo uso. Em outros casos, eles chegam a ser usados até três ou quatro vezes. Geralmente, depois disso, são vendidos para outra finalidade como, por exemplo, envelhecimento de destilados.
 
Dentro desse contexto, é importante ressaltar que a boa higienização das barricas é fundamental antes de sua reutilização. Isso porque, ao final de um uso, uma levedura chamada Brettanomyces pode contaminar o recipiente e, então, quando em grande quantidade, transmitir aromas desagradáveis ao vinho que será armazenado posteriormente.
 
Outro aspecto interessante sobre os barris é o fato de que costumam perder de 3% a 5% do vinho em seu interior ao ano. Esse volume deve ser completado com o mesmo vinho periodicamente, para manter a constância da superfície de contato do líquido com a madeira.
 
Novas tendências x tradição
 
A despeito das benesses do uso do carvalho tanto em brancos quanto em tintos, o que vem atualmente ganhando corpo e se mostrando uma tendência é o uso mais parcimonioso e consciente da madeira, a fim de ressaltar a fruta e a tipicidade do terroir. De fato, em aspectos gerais, ao se comparar o uso da madeira até meados da primeira década dos anos 2000 com a aplicação atual, é notável a mudança da atuação do carvalho, de personagem principal para uma espécie de coadjuvante, que trabalha em prol das qualidades intrínsecas do vinho, promovendo a fruta, a tipicidade, o equilíbrio e o frescor.
 
No entanto, no mundo do vinho, nada é absoluto e alguns estilos em que a madeira tem papel fundamental e definidor de estilo mantêm-se inabalados por essa tendência, haja vista os tintos Reserva e Gran Reserva da Rioja, os melhores brancos da Borgonha – Montrachet, Corton-Charlemagne, Chablis Grand Cru, por exemplo –, os tradicionais Chardonnay californianos e, porque não, os memoráveis Porto Vintage, enaltecidos e moldados por carvalho novo e elaborados para durarem por décadas.
 
Tamanho conta
 
Além do tipo de carvalho, de sua origem e de sua tosta, também o tamanho do recipiente por onde o vinho passará é de suma importância para determinar a influência sobre a bebida. Quanto menor o recipiente, maior o contato do líquido com o carvalho e, consequentemente, maior a transferência de aromas e componentes.
 
De forma genérica, chamamos esse recipiente de barril. Entretanto, de acordo com sua capacidade e também de acordo com a região onde são utilizados, pode haver denominações específicas. As principais delas são:
 
 
Por: Eduardo Milan
Fonte: Revista Adega

terça-feira, 22 de dezembro de 2015

Qual a relação entre Mona Lisa e o Vinho?

Mona Lisa, A Gioconda. Não há obra de arte mais vista e discutida no mundo. Sua sala no gigantesco Museu do Louvre, em Paris, está sempre repleta com gente de todos os cantos aglomerando-se para admirar e reverenciar o quadro mais enigmático e famoso da história da humanidade.
 
Aquele sorriso leve, obscuro, a pose recatada, o semblante algo que velado de uma figura feminina diante de uma paisagem sutil pintada em uma tela de madeira de álamo de apenas 77 x 53 centímetros reúnem detalhes que intrigam pesquisadores até hoje. Para tentar decifrar a obra do gênio Leonardo da Vinci, estudiosos foram atrás da pessoa retratada pelo artista.
 
Depois de anos e anos de análises de documentos, acredita-se que o retrato é de Lisa di Anton Maria di Noldo Gherardini. Anton Maria di Noldo Gherardini era um nobre florentino, que teve duas esposas falecidas por complicações no parto. Lisa, nascida em 15 de junho de 1479, é filha dele e de sua terceira esposa, Lucrezia di Caccia. A moça se casou com Francesco di Bartolomeo di Zanobi del Giocondo, um comerciante, em 1495.
 
Supõe-se que Da Vinci e o comerciante tenham sido amigos e a pintura de sua mulher começou a ser feita em 1503. Após quatro anos trabalhando sobre esse quadro, deixou-o inacabado. Anos depois, Leonardo levou a obra para a França, quando lá se estabeleceu na corte do rei Francisco I.
 
Entretanto, mesmo depois de descobrir a identidade de Lisa Gherardini, os estudiosos pouco conseguiram depreender, já que, ao que parece, a vida dela foi extremamente comum, sem grandes feitos que pudessem ser dignos de registros históricos. Ou seja, o mistério de Mona Lisa permaneceu mesmo quando sua identidade foi revelada.
 
Da pintura ao vinho
 
Mais recentemente, contudo, um profundo estudo genealógico trouxe à tona uma nova relação da Gioconda, dessa vez com o vinho. Segundo documentos, Natalia e Irina Strozzi Guicciardini - herdeiras da Tenute Guicciardini Strozzi, produtora de vinhos e azeites na região de Chianti, mais especificamente na fattoria Cusona, em San Gimignano - descendem de Lisa Gherardini, sendo, provavelmente, a 15ª geração da família.
 
Como boa parte da população rica italiana (os Guicciardini e Strozzi são quase um império na Itália e possuem relações que remontam aos tempos de Maquiavel e dos Médici), Natalia e Irina possuem títulos de nobreza e, coincidentemente, estão no ramo das artes também, além de ajudarem a gerir a propriedade familiar que data do ano de 994. A primeira é bailarina clássica, a segunda, pianista.

Fonte: Revista Adega

O homem que transformou a vitivinicultura dos Estados Unidos

Crimeia, Rússia, 1920. A Guerra Civil ainda está a todo vapor. Três anos antes, a Revolução Russa tinha derrubado o Czar Nicolau II e agora o país está sob o comando dos bolcheviques, que lideram o Exército Vermelho. Ainda lutando para retomar a ordem monárquica, remanescentes da aristocracia criam o Exército Branco.
 
Em uma das áreas de maior disputa, a Crimeia, uma península no Mar Negro, ao sul da Ucrânia, está um jovem de 19 anos e apenas 1,50 m, mas bravo, tentando empunhar uma arma. Filho de uma família de aristocratas de Moscou, até pouco tempo atrás André Tchelistcheff vivia uma vida bastante pacata, todavia, quando seu pai, oficial de justiça da Suprema Corte russa, entrou na lista de pessoas a serem exterminadas por Lenin, precisou fugir da capital russa às pressas e deixar de lado o mundo da nobreza czarista. Dias depois, os impiedosos bolcheviques arrasaram a propriedade da família, mataram os cães e os penduraram nas árvores diante da casa.
 
Apesar de diminuto em tamanho, André mostrou-se determinado, pediu licença ao pai – que havia se tornado Ministro da Justiça do Governo do Exército Branco do Sul – para entrar na escola de cadetes de Ekaterinodar e alistar-se às tropas comandadas pelo Barão Pyotr Nikolayevich Wrangel na Crimeia. Mas o inverno de 1920 seria determinante para as intenções dos “Brancos” no sul da Rússia, assim como para o futuro daquele jovem.
 
A estepe está congelada pela neve. As batalhas são cada vez mais cruéis e sangrentas. Diante da investida “vermelha”, as tropas de Wrangel precisam recuar. Em um dos últimos confrontos, em meio à confusão de rifles, granadas e canhões, André cai ferido. As perdas são muitas, o que resta de seu pelotão bate em retirada deixando para trás centenas de cadáveres amontoados na neve, incluindo Tchelistcheff.
 
Dias depois, sua família recebe uma carta informando a morte do rapaz e prepara um serviço funerário em sua homenagem. No entanto, o jovem não estava morto. Contra todas as probabilidades, ao acaso, um cossaco encontra o pequenino André agonizante em meio aos gélidos corpos dilacerados da batalha. Esse soldado anônimo coloca-o sobre seu cavalo e o leva, inconsciente, para receber ajuda.
 
Pouco tempo depois, o Exército Branco foi expulso da Crimeia e o restante das tropas, incluindo André, já recuperado, recebe a autorização de seguir para Constantinopla, na Turquia, onde se reúne com sua família. De lá, eles rumam para a região que mais tarde seria chamada de Iugoslávia. Em seguida, o rapaz é enviado para a Bulgária, trabalhar como minerador. Por ser militar, consegue uma vaga na Universidade de Brno, na Tchecoslováquia, onde começa a estudar agricultura e enologia.
 
Da granja na França para a América
 
Formado, André decide se mudar para a França em 1930. Um de seus primeiros empreendimentos lá é uma granja, na qual ele, juntamente com um grande amigo, coloca todas as suas economias. Pouco tempo depois, uma violentíssima chuva de granizo mata todas aves. Depois disso, decide se inscrever no Instituto de Agronomia do renomado Instituto Pasteur, em Paris, para investigar os mistérios da fermentação e da microbiologia.
 
O interesse do jovem russo faz com que um dos proeminentes cientistas do instituto, o professor Paul Marsais, olhe para ele com carinho. Talvez por influência das preferências dos aristocratas russos, um dos primeiros trabalhos de Tchelistcheff é na poderosa Moët & Chandon. Sua primeira “bebedeira”, por sinal, tinha sido com Champagne Mumm, aos 11 anos, quando ele e sua irmã entornaram os restos das taças dos adultos durante uma festa de réveillon.
 
Nos anos 1930, quase ninguém na França sabia algo sobre vinhos norte-americanos. Pudera, durante mais de 10 anos, a parca indústria vitivinícola dos Estados Unidos sofreu um enorme baque com a Lei Seca, revogada somente em 1933. Entre os poucos produtores que conseguiram prosperar a Beaulieu Vineyard, de Georges de Latour.
 
Herdeiro de uma rica família de viticultores franceses, ele imigrou para a América nos anos 1880 depois que sua propriedade foi devastada pela filoxera. Católico fervoroso, Latour produzia vinho canônico e, com apoio dos líderes religiosos, passou a vendê-lo por todo o país. Assim conseguiu superar a Lei Seca.
 
Apesar de estar nos Estados Unidos, Latour fazia questão de manter as tradições francesas em sua propriedade. Quando seu enólogo resolveu se aposentar, o empresário decidiu ir até Paris para encontrar alguém que pudesse assumir o cargo. Coincidentemente, ele também conhecia o professor Marsais.
 
Latour insistia em ter um profissional francês, porém seu amigo no Instituto Pasteur afirmou que tinha vários nomes para indicar, mas que duvidava que algum deles poderia se adaptar ao ambiente da Califórnia. Assim sendo, indicou um estudante russo em cujo trabalho colocava muita fé.
 
Mesmo contrariado, Latour aceitou entrevistar o rapaz. De cara, impressionou-se com o quão baixo ele era, mas logo percebeu que aquele “pequeno frasco” continha as qualidades de que precisava nos Estados Unidos. Para Latour, uma das vantagens de André era ser bioquímico – pois assim ele poderia ajudar a solucionar os problemas dos vinhedos de Beaulieu, que estavam definhando. Dessa forma, em setembro de 1938, Tchelistcheff desembarcou nos Estados Unidos. Nos anos que seguiram, ele ajudaria a transformar por completo a vitivinicultura do país e, indiretamente, transformá-lo numa das grandes potências da indústria mundial.
 
A terra prometida?
 
Naquela época, a Beaulieu era uma das melhores vinícolas norte-americanas. No entanto, o espanto de André foi grande. As prensas e todo o restante dos equipamentos eram completamente ultrapassados. Para piorar, os vinhedos estavam em condições precárias. Em uma breve visita às instalações onde iria trabalhar por 35 anos, encontrou um rato boiando em um tanque de Sauvignon Blanc. Ele ainda provou os vinhos, a maioria de sobremesa, apenas para constatar o quão baixa era a qualidade, especialmente dos secos. Ele viu que vinhos e vinhedos recebiam enxofre em excesso e uma combinação de diversos químicos era colocada no mosto a esmo – como se fosse um tempero.
 
Era preciso uma reforma tanto nos equipamentos quanto na filosofia da empresa. Apesar de Latour ter concordado com as posições do russo, suas mudanças, contudo, demoraram para ser concretizadas, porque a vinícola precisava dar o lucro que a família esperava para manter o estilo de vida de que desfrutavam. Depois que Latour morreu, em 1940, ficou ainda mais difícil conseguir dinheiro para todas as inovações, pois a viúva, Madame De Pins, controlava com rédeas curtas todos os investimentos.
 
Uma de suas primeiras providências foi substituir tubulações, válvulas, bombas e peças da prensa que estavam completamente enferrujadas e causavam uma concentração enorme de metais no vinho. Da mesma forma, ele começou a investigar as uvas que melhor se adaptavam à região, eliminando muitas das variedades rústicas que até então eram misturadas nas vinhas e nos vinhos, apostando no potencial da Cabernet Sauvignon. Tanto que, um ano após a morte de Latour, André engarrafou a safra 1936 de seu Cabernet Sauvignon como Georges de Latour Private Reserve – que se tornaria um dos rótulos mais célebres da Califórnia nos anos seguintes.
 
Pioneirismos
 
A veia de pesquisador de Tchelistcheff não arrefeceu com sua vinda para a América e tampouco com o baixo orçamento com o qual tinha que lidar na Beaulieu. Juntamente com um professor da UC Davis, o russo ajudou a desenhar um tanque de aço inoxidável (novidade na época) para controlar a temperatura de fermentação, algo que antes era feito, no desespero do calor da colheita, jogando gelo sobre a pensa. André também estava de olho nos Pinot Noir da vinícola Hanzell que, em 1959, teria criado um dos primeiros vinhos da história com fermentação malolática controlada – em vez de espontânea. Da mesma forma que ele observou as primeiras fermentações a frio de brancos e rosés na vinícola Charles Krug. Em ambas, o russo já prestava consultoria.
 
Assim, em 1962, a Beaulieu se tornou a primeira vinícola de larga escala a trabalhar com fermentação malolática em todos os seus tintos. Juntamente com Mike Grgich, outro pioneiro da vitivinicultura norte-americana, André desenvolveu sistemas de proteção contra geadas com uso de aquecedores, que queimavam diesel, aliados a máquinas de vento que sopravam ar mais aquecido perto da superfície do solo. Grgich era um imigrante croata que trabalhou com Tchelistcheff na Beaulieu entre 1959 e 1968 e, mais tarde, ficaria famoso por ser o enólogo por trás do Chardonnay da vinícola Montelena, vencedor do Julgamento de Paris em 1976.
 
Ainda em 1962, André resolveu testar um sistema de filtragem depois de perder 10 mil garrafas de rosés contaminadas com bactérias e leveduras. Durante diversas semanas, ele, Grgich e uma empresa de filtros trabalharam para desenvolver um sistema de dupla filtragem – que primeiro colocava o vinho em um filtro tradicional e depois em um microscópico. Tempos depois, diversas vinícolas adotaram o procedimento.
 
Ele também foi o primeiro a envelhecer os tintos em pequenas barricas de carvalho francês. Foi dessa forma que o russo ajudou a definir o estilo do Cabernet Sauvignon californiano – potente e opulento – que, anos depois, seria consagrado com a vitória sobre os vinhos bordaleses no Julgamento de Paris.
 
Influências
 
Ainda durante seu trabalho na Beaulieu, Tchelistcheff abriu um laboratório de pesquisa no centro de Santa Helena, onde prestou consultoria, ensinou e serviu como mentor para diversos jovens e brilhantes enólogos que, assim como ele, mudariam para sempre a história do vinho norte-americano. Entre seus discípulos houve nomes como Louis Martini, Robert Mondavi, Joe Heitz, August Sebastiani, John Daniel, Mike Grgich, Richard Peterson, MaryAnn Graf, Warren Winiarski, Rob Davis, Michael Silacci, Mike McGrath, Jan Shrem, Rick Sayre, Marco Cappelli, Heidi Peterson Barrett, Jill Davis etc – grande parte da nata da enologia dos Estados Unidos.
 
Além disso, André foi um dos primeiros a plantar Pinot Noir e Chardonnay na região de Carneros, assim como Pinot Gris no Oregon e Cabernet Sauvignon em Washington State, sendo um dos grandes incentivadores da vitivinicultura nessas áreas do país. Apesar disso, ele nunca conseguiu ter uma vinícola própria. O mais perto que chegou disso foi quando se associou a Frank Bartholomew para renovar a histórica propriedade da vinícola Buena Vista, mas, devido à forte recessão, precisou vender seus 50% da sociedade para Bartholomew, depois de ter investido muito dinheiro nela. “Sou um filho da revolução. Sei o que é perder tudo do dia para a noite”, disse certa vez.
 
Em 1968, o russo ainda foi surpreendido com a venda da Beaulieu para uma empresa de licores, Heublein. Apesar de ter sido o último a saber, ele ainda permaneceu na propriedade até 1973. A partir daí, passou a trabalhar como consultor independente para inúmeras vinícolas norte-americanas. No últimos anos de sua vida, ele voltou para Beaulieu como consultor e morreu aos 92 anos, em abril de 1994.
 
Sua reputação entre seus pares e sua influência na indústria do vinho norte-americana são tamanhas que ganhou diversas alcunhas durante os anos em que esteve na ativa, como “maestro”, “o decano do vinho americano”, “o enólogo dos enólogos”, entre tantos outros nomes que comprovam a sua lenda.
 
Por Arnaldo Grizzo
Fonte: Revista Adega

O vinho e as diversas sensações que ele provoca

Descrever os sabores e aromas do vinho é uma tarefa prazerosa. Frutas negras maduras, tons tostados, notas cítricas, especiarias etc. Os descritores são inúmeros, mas você sabe como essas sensações se formam?
 
Primeiramente, para que se crie a sensação de sabor, diversos sentidos devem interagir, como o aroma, paladar, tato e até mesmo audição e visão. Por isso, o famoso ritual "olhos-nariz-boca" é importante para que se tenha a sensação de sabor mais complexa, completa e prazerosa. E é por isso que pedimos muita atenção quando falamos em "degustar o vinho", um termo que deve englobar um grande conjunto de sensações.
 
Apesar de todas essas variáveis na sensação de sabor do vinho, a combinação mais importante fica por conta da interação entre o gosto e o aroma. O gosto engloba os quatro gostos básicos, mas, no caso dos vinhos: doce, amargo e azedo, de substâncias não voláteis, percebidas em receptores específicos da língua.
 
Enquanto isso, o olfato é o componente sensorial resultante da interação de componentes voláteis dos vinhos com os receptores olfativos da cavidade nasal. O estímulo a essa sensação pode ser ortonasal (odor entra na região olfativa diretamente ao se inalar o ar contido na taça, acima do vinho) ou retronasal (quando o odor entra na cavidade nasal a partir da cavidade bucal ao se ingerir o vinho).
 
O vinho é uma bebida de aromas complexos, pois possui mais de 500 compostos voláteis em sua composição que, juntos, são responsáveis pela formação do seu aroma característico. Além da infinita complexidade, a combinação na percepção de cada molécula pode resultar em uma quantidade quase incontável de notas aromáticas.
 
Para comprovar a importância da interação entre gosto e aroma na sensação de sabor, basta ver que muitas pessoas dizem não sentir gosto quando estão com o nariz entupido. Outro exemplo clássico é a atribuição de descritores de gosto aos aromas: "Esse vinho tem aroma azedo ou doce", apesar de o sistema olfativo não possuir receptores para esses descritores.
 
Dessa forma, o termo sabor está combinado ou integrado com a percepção de aroma (odor) e gosto, e, em menor grau, a sensações de resposta neural (por exemplo: adstringência dos taninos, efervescência e frescor de outros compostos etc), textura/sensações táteis e aparência global. Toda essa complexidade torna difícil a distinção entre aroma e gosto como dois sentidos fisiológicos distintos, já que ambos são frequentemente percebidos simultaneamente.
 
Formação do gosto básico

 Os componentes responsáveis pelo gosto básico do vinho, bem como por suas propriedades estimulantes, contribuem diretamente com a qualidade final do produto. Nesse caso, três classes determinam as características majoritárias do gosto dos vinhos: os componentes estimulantes (sendo que dentre os mais importantes está o álcool etílico); os ácidos (cujo conteúdo determina a acidez do vinho); e os açúcares (sendo que o conteúdo de açúcar residual determina se o vinho é mais seco ou mais doce).
 
Além desses grandes grupos, um fator de grande importância para o gosto e sabor do vinho é a adstringência, que, muitas vezes, é confundida com o amargor. Embora não sejam a mesma coisa, podem estar associados, pois muitos compostos que têm sabor amargo podem conferir uma sensação de adstringência.
 
Outros componentes colaboram com a percepção do gosto básico, ainda que nem sempre positivos, como o amargor, influenciado por componentes de diversas classes químicas, e o toque salgado, proveniente do teor de sais minerais presentes, principalmente o cloreto de sódio.
 
Os compostos que contribuem para esses gostos básicos são substâncias não voláteis, solúveis em água ou em misturas água/álcool. A associação de todos esses compostos com os aromas e substâncias voláteis são responsáveis pelo complexo sabor do vinho, que envolve uma série de reações e estruturas químicas diversas.
 
Algumas ressalvas importantes, uma é o caso especial do álcool etílico, pois, apesar de se tratar de um composto volátil, na quantidade em que é encontrado no vinho também pode colaborar com a sua doçura (juntamente com o glicerol), e os ácidos, como o ácido acético, por exemplo, que são levemente voláteis e, além de contribuírem com a acidez do vinho, podem colaborar com o perfil aromático.
 
Os principais componentes da formação do gosto Acidez
 
A acidez de um vinho é resultado da presença majoritária de diversos ácidos orgânicos, além de uma pequena quantidade de inorgânicos e de outros compostos que colaboram com essa percepção. Os ácidos podem ser diretamente derivados das uvas, formados no processo de fermentação ou pelos micro-organismos, além dos compostos específicos produzidos por uvas botritizadas.
 
Dentre os mais importantes se destacam o ácido tartárico, málico e cítrico, provenientes das uvas, e o ácido lático (presente em maiores concentrações nos vinhos que passaram pela fermentação malolática, desejável em muitos vinhos tintos) e succínico, gerados ao longo da fermentação, apesar de diversos outros estarem presentes e serem importantes para a acidez final do vinho.
 
É interessante ressaltar que as diferentes variedades de uvas apresentam conteúdos de ácidos distintos, sendo responsabilidade do enólogo administrar isso ao longo do processo de fabricação do vinho, para adequar o seu conteúdo ao produto final. Fatores climáticos, durante a maturação e colheita, também podem refletir no nível de maturação da uva que, por sua vez, determinará o seu conteúdo de ácidos e o seu sabor.
 
Sendo assim, acidez contribui direta ou indiretamente para a qualidade do vinho, pois está relacionada, por exemplo, ao gosto ácido do vinho. Vinhos com acidez insuficiente pode deixá-lo insípido, enquanto em excesso pode dar características de azedo.
 
A acidez também está relacionada ao pH, que por sua vez pode afetar diversos aspectos químicos e influenciar em reações importantes para a formação do aroma, gosto e qualidade. Por exemplo, um pH relativamente baixo ajuda na proteção do vinho contra a contaminação microbiana e faz com que a utilização de dióxido de enxofre tenha maior efeito. Além disso, ajuda a expressar a coloração vermelha dos vinhos tintos e reduzir a incidência de escurecimento dos compostos fenólicos presentes. O pH é muito importante para a estabilidade do vinho, sendo que uma acidez adequada será um requisito importante para o potencial de envelhecimento.
 
Doce
 
O conteúdo residual de açúcares (sacarídeos), glicose e frutose determina a sensação primária de um vinho entre seco ou doce. Essa informação é responsável por uma das principais divisões nos tipos de vinhos como secos (entre 0,2-0,8 g.L-1 de glicose e 1,2 g.L- 1 de frutose) ou doces (de 30 e 60 g.L-1, respectivamente).
 
Do ponto de vista prático, a contribuição do álcool etílico e do glicerol à percepção do doce do vinho também deve ser considerada, embora em menor escala. Então, a quantidade e intensidade do gosto doce dependem principalmente da concentração e da estrutura dos açúcares presentes, bem como de outros parâmetros como a temperatura, pH e a interação com outros componentes.
 
Uma das interações que deve ser destacada fica entre a acidez e o doce, sendo que vinhos mais doces necessitam de uma acidez mais destacada para não se tornarem muito apagados. Contrariamente, vinhos muito ácidos e sem qualquer doçura podem resultar em vinhos descritos como ácidos ou azedos ao extremo, o que não é interessante.
 
O conteúdo residual de açúcares, glicose e frutose determina a sensação primária de um vinho entre seco ou doce
 
Amargor e adstringência
 
Embora a adstringência e o amargor sejam constantemente confundidos, eles apresentam diferenças consideráveis, além de afetarem diferentes áreas da boca e da língua, de maneira distinta.Apesar de suas diferenças, esses termos sensoriais podem ter semelhanças no que diz respeito aos seus compostos químicos básicos, os polifenóis, que são provenientes das uvas e do carvalho. Dentro desse grande grupo são encontradas duas classes: o grupo flavonoide e os compostos não flavonoides.
 
No caso específico das uvas Vitis Viníferas, os principais compostos fenólicos encontrados são os ácidos fenólicos e seus conjugados (não flavonoides), flavan-3-ols (e polímeros de taninos condensados), antocianinas, flavanols e flavonoides.
 
Amargor
 
Diversos compostos são importantes quando temos a sensação de amargor. No caso dos vinhos brancos, os principais responsáveis por conferir certo amargor são pequenas quantidades de catequinas e leucocianidinas. Nessa classe, compostos como os chamados flavononols, a flavonona naringinina (presentes em variedades como a Riesling, por exemplo) apresentam um amargor leve, mas, nas concentrações finais em que são encontradas, não chegam a afetar os vinhos. Entretanto, um composto com maior recorrência é o tirosol, que, presente em uma concentração entre 20-30 mg.L-1, pode conferir ao vinho, branco ou tinto, uma sensação de amargor muito pronunciada.
 
Nos tintos, novamente a classe de flavan-3-ols e seus derivados podem ser responsáveis pelo amargor. Mas, realmente, não é uma tarefa simples distinguir entre o amargor e a adstringência, pois é importante destacar que, em muitos casos, alguns polímeros tendem a conferir mais adstringência do que amargor quando em solução, aumentando a dificuldade de distinção do paladar e a capacidade de detecção. E o contrário também é válido como, por exemplo, a combinação entre as antocianinas e os taninos que, no caso dos vinhos jovens, proporciona mais amargor do que adstringência, pois suas estruturas ainda estão passando por mudanças.
 
Adstringência
 
A adstringência é uma característica essencial dos vinhos tintos e confere um certo "corpo", sensorialmente descrito como a sensação de boca seca, dura ou áspera. Nos tintos, a adstringência é proveniente principalmente da presença dos compostos fenólicos flavonoides, constituintes naturais das uvas. Durante a produção, se houver a extração excessiva desses compostos, o vinho resultante poderá ser muito adstringente e áspero, precisando de um longo tempo de maturação para perder um pouco dessas características e tornar-se mais aveludado.
 
A adstringência não é detectada pelas papilas gustativas e muito menos pelo epitélio olfativo, mas é a sensação seca e áspera percebida na boca. Esse mecanismo ainda é pouco compreendido e bastante estudado. A primeira hipótese surgiu em 1973, quando os autores sugeriram que os compostos adstringentes agiam nas proteínas presentes na saliva, se complexavam e resultavam na perda da capacidade dessas proteínas de lubrificarem a boca, causando uma sensação seca.
 
E se pensarmos nas interações entre os diferentes compostos, nesse caso temos outra, pois a combinação entre acidez e adstringência nos vinhos também ocorre, sendo que a sensação de adstringência aumenta conforme a acidez do vinho diminui.
 
Outros compostos
 
Além desses e tantos outros compostos, alguns que também são essenciais para o sabor do vinho não poderiam deixar de ser lembrados:
 
Álcool etílico: pode ser considerado o componente mais importante do vinho, conhecido por suas propriedades sensoriais e estimulantes (e, em excesso, intoxicantes);
 
Dióxido de carbono: a dispersão desse composto na solução forma as bolhas, que provocam uma sensação importante para o paladar: o formigamento e a efervescência sentidos na mucosa da boca;
 
Dióxido de enxofre: adicionado para prevenir a oxidação do vinho, esse composto tem um efeito particular no sabor do vinho, contribuindo principalmente com compostos voláteis;
 
Oxigênio: o contato com o ar, e consequentemente com o oxigênio, pode ser responsável por diversas mudanças químicas sensoriais nos vinhos, positivas e negativas. Quando pensamos nos seus efeitos benéficos ao sabor (aroma e gosto), devemos lembrar de que o contato com o vinho tinto deve ser pequeno e periódico, com baixas quantidades de oxigênio durante a maturação, enquanto para os vinhos brancos até mesmo esse contato pode ser prejudicial.
 
Como se percebe, o sabor de um vinho depende da complexa interação de diversos compostos, seguindo diferentes reações químicas e influenciado por uma infinidade de variáveis. E é por isso que o vinho é tão subjetivo quanto o prazer que ele proporciona.
 
A adstringência não é detectada pelas papilas gustativas ou pelo epitélio olfativo, mas é a sensação seca e áspera percebida na boca
 
Por Gustavo Molina
Fonte: Revista Adega